sábado, 17 de abril de 2010

longas brasileiros em 2010 (90)


Filmes brasileiros assistidos ou revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

090 - O Menino e o Vento (1967), de Carlos Hugo Christensen *****

Normalmente, os filmes comentados aqui são publicados na ordem em que são vistos. Mas após a palavra Fim do que acabou de ser assistido agora ficou impossível obedecer qualquer método e hierarquia - e daí deixou uns três para trás. Há certos filmes que se impõem de forma avassaladora tamanha a força embutida neles, e que, parece, ficam maiores que a vida. Como esse belíssimo O Menino e o Vento. Em época tenebrosa em que o sexo ficou refém de estimulantes, em que as religiões o perseguem mais que professoras de catecismo enlouquecidas, e em que o papa e todo o clero se afogam publicamente em seu próprio veneno, filmes libertadores como esse deveriam banir compêndios de castração e serem exibidos em praça pública. É impressionante e gigante o talento de Carlos Hugo Christensen, esse cineasta argentino que ficou maior que sua terra e daí criou geografia própria, filmando também no Chile, Peru, Venezuela, e, para sorte nossa, radicalizando-se no Brasil em 1954. Sua filmografia é notável, e quando traz a literatura para as telas faz filmes embebidos de mestres como Aníbal Machado - Viagem aos Seios de Duília (1964), e esse O Menino e o Vento; Carlos Drummond de Andrade - Enigma para Demônios (1974); Jorge Luis Borges - A Intrusa (1979). O Menino e o Vento começa com a maria fumaça trazendo Enio Gonçalves de volta para a cidade mineira de Bela Vista, onde correu um processo à sua revelia e onde terá seu julgamento final. A acusação? o desaparecimento do adolescente Zeca da Curva - Luiz Fernando Ianelli, com quem manteve relacionamento estreito quando passou 28 dias em férias no local. Os moradores acusam-no de abuso sexual e assassinato, suspeita de crime homossexual reforçada e alimentada por Wilma Henriques, a dona do hotel que se apaixona pelo engenheiro, sem ser correspondida. Além de produzir e dirigir, Christensen assina o roteiro com o genial Millôr Fernandes - responsável pelos diálogos. O texto é realmente uma beleza, ainda mais dito pelo talento de Ênio Gonçalves, mais lindo que nunca e perfeito no papel com toda sua carga simbólica. O garoto Ianelli, que viria a atuar em outros filmes do cineasta, também surpreende como o amante do vento, elemento capaz de confortar e libertar suas descobertas do corpo e da sexualidade e que encontra eco nas revelações intímas e mais profundas de Ênio. Wilma Henriques, a Grande Dama do Teatro Mineiro, também acerta no tom da dona de hotel que tem o desejo desperto e sedento por reciprocidade a quaquer custo. Todos eles são açoitados pelo vento, que se revelará para eles e para a cidade como força libertária ou como força de punição - décadas depois Walter Lima Jr realiza o belo A ostra e o Vento (1997), em que esse último também age como agente propulsor da sexualidade. Outro destaque do filme e que impressiona é a bela fotografia de Antônio Gonçalves, com closes que invadem rostos e revelam o que se quer esconder como se atravessasem almas. Baseado no conto O Iniciado do Vento, de Aníbal Machado, o filme é momento luminoso na cinematografia nacional e um dos grandes da década de 1960. Afinal, não é todo dia que a sexualidade é retratada em nossas telas com tamanho vigor, poesia, complexidade e beleza como nesse estupendo O Menino e o Vento.

Cotações:
+ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

4 comentários:

  1. Pek,

    A foto que você colocou é muito bonita e tem várias leituras.

    Bjs.

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  2. Noel,
    É uma cena emblemática do filme.
    Você já assistiu?
    É uma beleza!
    Bjs

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  3. Bons tempos que eu tinha Canal Brasil e via um filmaço desse numa terça-feira a tarde na minha casa. Filme de uma força arrebatadora. Vai para uns quase dez anos que o vi e, relendo seu texto, veio intenso em minha mente.

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