sábado, 9 de janeiro de 2016

Longas Brasileiros assistidos em 2016 (010)

Uma longa viagem (2011)
Direção: Lucia Murat



Lucia Murat é um caso único dentre os cineastas, homens ou mulheres, pois a sua história pessoal já é um roteiro pronto – e já virou vários filmes. Durante a ditadura civil-militar, ela atuou na luta armada, foi presa e torturada, e ficou encarcerada durante três anos e meio. O primeiro sobre o tema e a partir dessa sua história, Que bom te ver viva (1988), é ainda o melhor deles. Depois dirigiu outros filmes, e em mais três retornou ao seu drama ou contexto pessoal e também de todo uma geração e um país – Quase dois irmãos (2004), Uma longa viagem (2011), e A memória que me contam (2012). A diferença deste Uma longa viagem é que nos outros ela usou atores para encarnarem ela e seus companheiros de luta, já aqui, ainda que também utilize um ator, Caio Blat, ela mesma está em cena, em primeiríssima pessoa.


Uma longa viagem é um registro familiar sobre ela e dois de seus irmãos. Com a morte do mais velho, Miguel, ela recupera as cartas que o mais novo, Heitor, um andarilho pelo mundo, escreveu para a família de diferentes países e continentes. Como Miguel era um médico com forte atuação social e Lúcia se tornara uma militante política, a mãe dos três resolve mandar Heitor para fora do país, receosa de que ele seguisse os passos da irmã. E é aí que ele inicia uma longa viagem tanto pelo mundo quanto pelas drogas, em seus mais diferentes formatos e calibres. A época que Heitor escreve as tais cartas é  grande parte do período que Lucia está presa, na década de 1970, daí, com isso, ela refaz não só a história de uma família, mas também do período mais sombrio do Brasil. Para contar essa história, a cineasta se coloca em cena junto com Heitor, que depois de tantos experimentos tornou-se esquizofrênico - informação que o filme não fornece -, ainda que bem-humoradamente lúcido. E coloca em cena também o ator Caio Blat, que encarna o irmão na juventude, não só escrevendo as cartas, como também as lendo e interpretando. O maior achado do filme reside exatamente nesse recurso, já que Blat atua em monólogo sobre projeções, seja de fotos ou de vídeos, o que causa belo efeito cinematográfico, somado à  uma maravilhosa composição do ator. Uma longa viagem é um filme premiado e comentado - no Festival de Gramado de 2011 ganhou, inclusive, o prêmio máximo de Melhor Longa e também o de Melhor Ator e Especial do Júri. Muitos se emocionam e se divertem com o depoimento de Heitor e suas cartas, já para mim esse embarque não se completa. Penso que o maior, e melhor, atrativo está mesmo na estética que a cineasta adotou para fazer a sua viagem e nos fazer conduzir por ela.

Longas Brasileiros assistidos em 2016 (009)

Meu destino é pecar (1952)
Direção: Manuel Peluffo



Assim como aconteceu no Rio de Janeiro com a Cinédia e a Atlântida, São Paulo também investiu em estúdios de cinema na primeira década do século passado. A ambição dos paulistas era grande, nada menos que a industrialização do cinema brasileiro. O mais bem-sucedido foi a Vera Cruz, mas podemos citar também a Maristela e a Multifilmes.  Nas décadas de 1950 e 60, a Maristela produziu cerca de uma dezena e meia de longas, e Meu destino é pecar (1952) é um de seus títulos. Primeira adaptação cinematográfica de Nelson Rodrigues, aqui sob o pseudônimo de Suzana Flag, o filme é dirigido pelo uruguaio Manuel Peluffo. E se os outros estúdios tiveram suas musas, como Carmen Miranda e Gilda de Abreu na Cinédia; Eliana Macedo e Adelaide Chiozzo na Atlântida; e Eliane Lage e Tônia Carrero na Vera Cruz; a Maristela também teve as suas, como Vera Nunes e Antonieta Morineau.


Em Meu destino é pecar, Antonieta Morineau é Leninha, bela jovem obrigada pela madrasta a se casar com um homem que não ama, Paulo (Rubens Queiróz), devido aos problemas financeiros de sua família – inclusive para comprar uma perna mecânica para a irmã mais nova, Netinha (Nair Pimentel). Daí vai para ele com sua fazenda, onde tem que enfrentar a memória fantasmagórica de Guida, a primeira esposa, presença onipresente e sufocante na casa e na família composta, dentre outros, pela obsessiva prima do marido Lídia (Zilah Maria) e pelo irmão cafajeste e sedutor dele Maurício (Alexandre Carlos). Depois desse Meu destino é pecar várias obras de Nelson Rodrigues chegaram ao cinema, e pode-se, inclusive, notar nelas uma certa identidade estética na forma de filmá-las e no estilo de interpretação de seus personagens. Aqui, a condução é pesada, com certo ranço teatral, ainda que não descarte belos planos, como a visita de Leninha ao mausoléu da família do marido debaixo de chuva torrencial. Mas no geral Manuel Peluffo não consegue imprimir nem os elementos de horror que impregnam a narrativa, e nem faz uma eficaz direção de atores. O exemplo maior está na personagem Lídia, a mais fascinante da história, prima de Paulo obcecada pelo fantasma de Guida, que tem na interpretação de Zilah Maria um registro sem nuances – Esther Góes nadaria de braçada em interpretação maravilhosa na minissérie homônima realizada pela Globo em 1984. Já Antonieta Morineau está bem, e linda - pena que atuou só em mais um filme, o anterior Presença de Anita (1951), de Ruggero Jacobbi, abandonando o cinema depois.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Longas Brasileiros assistidos em 2016 (008)

A prisão (1980)
Direção: Osvaldo de Oliveira



Filmes sobre presídios formam um subgênero potente do cinema mundial e que fazem as bilheterias tilintarem – os americanos adoram. E quando a ação se passa em presídios femininos aí é que os marmanjos de plantão salivam em combustão. Sobretudo se forem as produções da Boca do Lixo nas décadas de 1970 e 80, pois daí é certo que além das brigas arranca-cabelo, as moças vão mostrar o corpo fartamente, seja em banhos de sol, seja em cenas de sexo entre elas. Dessa produção do período no pedaço paulista podemos citar dois exemplos bacanas: Escola penal de meninas violentadas (1977), de Antônio Meliande; e Fêmeas em fuga (1985), de Michele Massimo Tarantini. E, acima de todos, temos A prisão (1981), de Osvaldo de Oliveira, o mais famoso deles, inclusive com carreira internacional. É que o filme rodou mundo em uma cópia, não sei se pirata ou não, com as belas/feras dubladas, e que é a versão assistida com legenda em português. Veterano nome do cinema brasileiro com passagem por diferentes áreas técnicas - com importante carreira como fotógrafo -, como diretor o Carcaça, como era chamado, diversificou-se em muitos gêneros e subgêneros: dramas, comédias, policial, faroeste, cangaço, sertanejo, aventura, sátira, e, claro, os filmes de presídio.


Em A prisão, a loiraça – ainda que as partes pudicas traiam a psiquê blondie – Maria Stela Splendore é a diretora lésbica e sádica do recinto, que comanda sua detentas com direito a sessão de torturas e de amassos. Tudo isso para espanto de sua assistente, a bela Neide Ribeiro, a única estrela do elenco que não protagoniza cenas eróticas, no máximo aparece nua em uma cena. Entre as detentas têm piteuzinhos como Márcia Fraga, Daniele Ferrite e Nádia Destro, todas feitas de gato e sapato pela diretoria, que inclui Marta Anderson – a melhor do elenco – como uma enfermeira tresloucada viciada em éter. Por fim, tem ainda Meiry Vieira, como uma escravagista que compra as meninas em dólar para seu desfrute sexual. A prisão não economiza em cenas de torturas, nudez, sexo entre as garotas ou entre elas e as carcereiras. E quando a ação avança, cenas de sexo explícito também marcam ponto na narrativa. Todas aquelas mulheres deixam de ser gente para se transformarem em objetos de prazer e de sadismo, não à toa são rebatizadas e chamadas por números e não mais por nomes. Para além do gozo e da exploração de seus corpos, há, no roteiro de A prisão, um entendimento crescente de que aquele mundo é real e que toda aquela gente está submetida apenas a sua sorte. E isso dentro ou fora da prisão, seja como encarceradas, como fugitivas ou como mercadoria comprada, pois quando não penam e morrem entre os muros, penam e morrem sob as garras de seus novos donos. Quando dão o último suspiro, assassinadas por colegas, pela diretoria ou por quem as compra o destino é a vala rasa ou como comida de peixe. E daí, vai se instalando um certo desconforto frente ao mostrado, num misto de tristeza e excitação doentia.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Longas Brasileiros assistidos em 2016 (007)

Os carrascos estão entre nós (1968)
Direção: C. Adolpho Chadler


O baú do cinema brasileiro é mesmo infinito e inacreditável. Sempre que se fala sobre nazistas em nossos filmes vem de imediato o notável Aleluia, Gretchen (1975/76), de Sylvio Back. Mas aí tem esse Os carrascos estão entre nós, que C. Adolpho Chandler dirigiu, e protagonizou ao lado de Atila Iório, em 1968. Há muito sei sobre esse filme, mas só agora tive oportunidade de assisti-lo. E as surpresas só aumentam ao ler a ficha técnica. Afinal, o filme foi produzido pela Cinedistri de Oswaldo Massaini, e ainda tem como associados a união daqueles que foram os dois galãs mais famosos das chanchadas da Atlântida, Anselmo Duarte e Cyl Farney. Não é demais!  A variedade das produções da Boca do Lixo é um capítulo a parte na história do nosso cinema, e ainda tem desavisado que acha – sim, ainda tem gente que pensa isso -, que por lá foi só mesmo filme de mulher pelada.


Em Os carrascos estão entre nós, em 1944 alguns nazistas se refugiam no Brasil, com direito a transporte em submarino, operação plástica em pleno bordo, e explosão do cujo para não deixar pistas do refúgio dos monstros de guerra. E com direito também a um Átila Iório encarnando um alemão com sotaque e tudo. Sim, porque se no Cinema Novo ele foi o nordestino retirante de Vida secas (1963), na Boca o buraco é mais embaixo, e aí ele ganha cabelo aloirado e vilania germânica. No encalço desses criminosos, que se escondem no país e agem em uma secreta irmandade chamada de Aranha, estão dois policiais detetives, um brasileiro interpretado pelo próprio Chadler, e um americano interpretado pelo gringo Larry Carr. Esse último acaba por se envolver com a misteriosa Eva, em bela aparição e atuação de Karin Rodrigues. O filme  conta com vigorosa fotografia p&b de Afonso Viana e a elegância de Erlon Chaves na trilha musical, o que já nos apresenta a ambiência que permeará o mostrado já nos créditos. Com sua narrativa em labirinto, que mais esconde que clareia, Os carrascos estão entre nós é uma produção curiosa sobre um tema apropriado, já que sabemos que a América do Sul foi mesmo destino para os criminosos nazistas, como foi o caso de Josef Mengele no Brasil - o terrível médico do Riech conhecido como "Anjo da Morte". E muito sintomático que a Boca do Lixo, nicho riquíssimo para a proliferação da diversidade do cinema brasileiro, tenha se detido sobre o tema.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Longas Brasileiros assistidos em 2016 (006)

Sinal Vermelho: as fêmeas (1972)
Direção: Fauzi Mansur


Fauzi Mansur é mesmo um cineasta que merece ser mais comentado. Não só em relação aos seus pares dentro do modelo de produção da Boca do Lixo, mas no cinema brasileiro como um todo. Há uma elegância na forma como filma e apresenta seus personagens que o torna quase único na Boca nesse registro. E há ainda um viés existencialista muito perceptível em seus filmes, que vai desaguar com toda a sua força no seu maior momento, A noite do desejo (1973). Os planos são pensados, nunca atirados a rodo. A fotografia não tende a realçar o mostrado, mas embuti-lo de significados, que, muitas vezes, não estão nas falas e nem na ação, mas dentro da persona daqueles homens e mulheres que trouxe á cena. E isso já está em seus primeiros filmes, como Sinal vermelho: as fêmeas (1972), que marcou a estreia de Vera Fischer no cinema.


Em Sinal vermelho: as fêmeas vemos um Sérgio Hingst – um dos atores mais interessantes do nosso cinema - sisudo, ofendido e dissimulado. O motivo ele conta para a esposa, a lindíssima Marlene França: a firma ganhou muito dinheiro, inclusive ás minhas custas, e agora eles, a diretoria, resolvem fechar o negócio, e eu, como fico? É aí que resolve aplicar um grande golpe contra os ex-parceiros e para isso contrata uma turma da pesada chefiada por Ozualdo Candeias e com a presença de um David Cardoso em crise. Depois do roubo, ele coloca todos em uma casa de praia a fim de que a poeira abaixe.  Ficam lá a esposa, a filha, Vera Fischer, e o bando – além de Candeias e Cardoso, Roberto Bolant, Enoque Batista. O que seria apenas um esconderijo vira uma bolha de alta combustão, inclusive sexual. E, mas que isso, nada é tão preto no branco como aparenta. Sinal vermelho: as fêmeas é filme policial jamais rasteiro, e não muito simples de acompanhar, já que vai e volta em sua narrativa, exigindo atenção da plateia. Fauzi Mansur não facilita o jogo ao público de seu cinema popular, aposta, acertadamente, na sua inteligência.

terça-feira, 5 de janeiro de 2016

Longas Brasileiros assistidos em 2016 (005)

Coração materno (1951)
Direção: Gilda de Abreu


Gilda de Abreu é capítulo importante na história do cinema brasileiro, e, para as mulheres, fundamental. Afinal, é uma das pioneiras na direção de longa-metragem no país; Cléo de Verberena foi a primeira com O mistério do dominó preto (1930), e Carmen Santos começou a dirigir antes de Gilda seu sonhado Inconfidência Mineira (1939/48), mas só o concluiu depois. E Gilda não debutou nas telas dirigindo um filme qualquer, foi nada mais nada menos que o arrasa-quarteirão O ébrio (1946), arrastando multidões aos cinemas na época. O filme é uma adaptação da canção homônima de sucesso - e da peça originada dela - de seu marido, o cantor e compositor popularíssimo Vicente Celestino, protagonizado pelo casal. Seu passaporte para o cinema foi um caminho derivado dos palcos, onde se consagrara como cantora de operetas, além de empresária e diretora. Soma-se a isso o fato de ter causado também em sua estreia como atriz de cinema no bem-sucedido Bonequinha de seda (1936), de Oduvaldo Vianna, uma produção do estúdio carioca Cinédia, o mesmo que produziu sua estreia como cineasta. Com essa carreira avassaladora, Gilda então leva, em seu segundo longa, mais uma adaptação de uma canção do marido, que também já originara peça de teatro, Coração materno (1951).


Coração materno, a música, seria prato cheio para um filme de horror, afinal conta a história tenebrosa de um casal em que, para provar seu amor, a mulher exige do amado que ele arranque o coração de sua própria mãe para oferta-la. Só que nas mãos de Gilda de Abreu essa história maravilhosamente sugestiva e horripilante virou um melodrama dos mais carregados, e o tal gesto tresloucado não passa de uma simbologia na trama – que é melhor não revelar. Coração materno é a história de amor entre um camponês bronco e uma jovem rica prometida em casamento a um conde falido. Maliciosa, ela, Julieta, faz gato e sapato daquele que a amou desde criança, até descobrir/assumir que também morre de amores por ele, Carlos, um homem abandonado em uma igreja e criado pelo padre – por isso é conhecido como o Enjeitado. Na época das filmagens, Gilda tinha entre 46/47 anos, e Celestino entre 56/57, mas isso não os impede de encarnar jovens moços suspirantes de amor, às voltas com encontros e desencontros, o que tira grande parte de identificação com a história. Amor materno tem produção caprichada, com cenários e figurinos condizentes com o pretendido, mas se afoga no roteiro pesado – também de Gilda – e na interpretação carregada de Celestino. Infelizmente, não chega perto do que foi/é O ébrio, o cartão de visitas do casal nas telas. Um adendo: só em 2003 a história contada na canção Coração materno ganharia seu registro de horror no acachapante curta Amor só de mãe, dirigido por Dennison Ramalho.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Longas Brasileiros assistidos em 2016 (004)

O prazer do sexo (1982)
Direção: John Doo


Berço por excelência do cinema popular, a Boca do Lixo produziu muitos filmes de diferentes gêneros e subgêneros. Um deles foi as famosas pornochanchadas. Só que pornochanchada é cinema popular, mas cinema popular não é pornochanchada. É também - como se sabe pornochanchadas são aqueles filmes em que tudo gira em torno de sexo gratuito sem acrescentar nada à história, apenas pretexto para tirar a roupa das mulheres e mostrar peitinhos, coxas e bumbuns. Se a década de 1970 foi o período para a produção dessa enorme gama de filmes na Boca, quando entram os anos 80 chegam os filmes pornôs. E aí, com o perdão do trocadilho infame, a Boca cai de boca no filão, o que se torna um caminho sem volta. As musas em quase sua totalidade abandonam o pedaço, e o mesmo vale para astros e alguns cineastas. Outros diretores aderem ao novo estado de coisas assinando sob pseudônimo ou não. O prazer do sexo (1982), de John Doo, se situa aí. Notável diretor de filmes de horror, como o longa Ninfas diabólicas (1979), e o episódio O gafanhoto (do longa Pornô, 1981), Doo também marcou presença como ator em vários filmes – tem ótima atuação no clássico O pasteleiro (1981), episódio dirigido por David Cardoso no longa Aqui, tarados!.


O prazer do sexo é mais uma parceria entre Ody Fraga e John Doo, o primeiro no roteiro e o segundo na direção. Mas se a dobradinha funcionou em outros momentos, aqui deu xabu, Mesmo porque o interesse maior dessa vez é a junção da mais reles pornochanchada com os filmes de sexo explícito que já batiam ponto na Boca. A estranha relação entre pai (Rubens Pignatari) e filho (Carlos Milani), que só conseguem se divertir juntos em noites de sexo com prostitutas, poderia até render caminho interessante vide a folha corrida criativa da dobradinha Fraga/Doo se o modelo de produção fosse outro. E quando na primeira cena ouvimos The winner takes it all do ABBA, e mais adiante One day in your life com os Jackson 5, a gente até pensa que vem coisa boa.  Mas não dessa vez, em que o fiapo de história – os dois se apaixonam, o pai por Zaíra Bueno e o filho por Márcia Aoki, o que desanda a velha parceria de farra – é recheado com cenas de sexo explícito que nada tem a ver com a trama. Faz até pensar no famoso recurso de algumas produções da Boca que enxertaram cenas explícitas em pornochanchadas depois de concluídas no período para tentar faturar na bilheteria. Zaíra Bueno, sempre bela, assim como em Coisas eróticas (1981) - o marco definidor do período pornô dirigido por Raffaele Rossi - não participa das cenas explícitas. Sem saber para que lado caminha, O prazer do sexo não vai para lugar nenhum, nem diverte como em algumas pornochanchadas, nem excita. Ainda no elenco feminino, Ana Maria Kreisler, como uma desinibida prostituta, e Áurea Campos como a governanta Consuelo.

domingo, 3 de janeiro de 2016

Longas Brasileiros assistidos em 2016 (003)

Até o último mercenário (1971)
Direção: Penna Filho


O produtor, ator, roteirista e diretor paulista Ary Fernandes parecia ter afeição pelo universo das forças armadas brasileiras, pelo menos por uma ideia de heroísmo que via em seus integrantes. Isso sem falar, claro, no apreço pela aventura, gênero importante habitado por heróis dos seriados da época que eram exibidos nas telas dos cinemas de rua. Na década de 1960, criou o marco televisivo O vigilante rodoviário, série que fez muito e merecido sucesso na época sobre a polícia rodoviária, revelou Carlos Miranda, o Vigilante, e sobrevive até hoje em interesse fílmico. Depois, criou ainda a série Águias de fogo, dessa vez sobre a força aérea. Por isso, nada mais coerente do que produzir o longa Até o último mercenário em 1971, dirigido por Penna Filho – com quem assina o roteiro – e protagonizado pelo mesmo Carlos Miranda. Mas se em O vigilante rodoviário o interesse persiste até os dias atuais é porque lá, além do pioneirismo histórico, havia um interesse em desenvolver os personagens que cruzavam o caminho do herói em cada episódio, o que humanizava a narrativa. Já aqui...


Em Até o último mercenário Carlos Miranda é o policial destacado para descobrir, investigar e desbaratar uma quadrilha de contrabandistas chefiada por Luciano Gregory e Marlene França – amada atriz e musa que Ary descobriu ainda adolescente para o filme Rosa dos ventos (1957), de Alex Viany, do qual era diretor de produção -, e mais alguns "habitués" do gênero das produções da Boca do Lixo como Tony Cardi, Genésio de Carvalho e Betinho. Há ainda a repórter que acompanha o caso enquanto suspira pelo policial, estreia no cinema da bela Elaine Cristina; e seu irmão adolescente aprendiz de detetive, Reginaldo Vieira, o Tuca da série televisiva. Mas não pensem que o entrecho amoroso ou mesmo a prisão da quadrilha é que estão mais valorizados na narrativa não - para se ter uma ideia, o policial segue os bandidos na espreita, mas de berrante camisa vermelha... O que a direção de Penna Filho estampa em holofotes garrafais é o aparelhamento da polícia militar, com direito à cenas de treinamento/desfile de cães, sala de instruções, exibição de maquinário e veículos de guerra, campanas, ataques coreografados em grupos e etc. Isso tudo com direito a trilha sonora bélica, o que, mais que constranger, deixa um gosto amargo já que aqueles – a época do filme – eram os temidos anos de chumbo. Desconforto que aumenta ainda mais com o texto de agradecimento final aos homens valorosos da polícia por manter a Ordem e o Progresso do Brasil. Mesmo se dessemos desconto para isso tudo, ainda assim o filme realmente não decolaria, pois o gênero policial - bela página do cinema brasileiro - e mesmo a aventura estão aqui apresentados sem vigor e sem maiores elaborações. Ary Fernandes é um nome importante do cinema popular, mas Até o último mercenário não é, nem de longe, um de seus melhores feitos.