sábado, 21 de agosto de 2010

longas brasileiros em 2010 (192)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

192 - 400 Contra 1 - A História do Crime Organizado (2010), de Caco Souza +

Afora as presenças luminosas de Andrea Beltrão, Denise Weinberg, Eucir de Souza e Lee Thalor, Salve Geral (2009), de Sérgio Rezende, acertava em humanizar os presos, mas errava no retrato maniqueísta da polícia. Já nesse 400 Contra 1 - A História do Comando Vermelho ninguém parece ser de verdade, seja quem está do lado da lei ou contra ela. E daí fica-se o tempo inteiro vendo essa gente como se fosse estatística, prática mais do que usual como a imprensa do espetáculo e a sociedade idem pintam esse universo-cão dia a dia. Basta 1 minuto de filme - e não vai aqui nenhum trocadilho com o título - para um incômodo se instalar de pronto: é filme brasileiro ou americano? Porque aquela estética picotada em cortes por segundo só nos faz esperar que Wesley Snipes apareça a qualquer momento dando pernada e tiros a três por quarto. Mas aí olhamos mais de perto e vemos que é Daniel Oliveira, Fabrício Boliveira, Lui Mendes, Jefferson Brasil, Jonathan Azevedo e mais Daniela Escobar, todos com aquela pinta de Onze homens e nenhum segredo em assaltos espetaculares a bancos. E pior, começa então um tal de vai para trás e volta para a frente, com a trama mostrando quem eles eram lá no presídio nos 70 e aqui do lado de fora nos 80, em montagem que rivaliza em disputa com aceleração dos tais cortes. 400 Contra 1 conta a história de como se formou o Comando Vermelho, cujo ninho da serpente seria a convivência entres marginais de toda sorte, e azar, e presos políticos trancafiados na Ilha Grande na década de 1970 durante a ditadura militar. Lucia Murat visitou o tema em Quase Dois Irmãos (2004), só que em chave diferente - inseriu personagens externos e interseccção entre morro e asfalto via amor e morte. Aqui, conta-se essa história com foco em William, um dos líderes da organização - o filme é baseado em seu livro - sua paixão/parceria com Tereza, a Loira - Daniela Escobar, a relação com a inacreditável advogada Carmen - Branca Messina, e também com pinceladas para outros personagens do bando. Mesmo talentoso, Daniel Oliveira não tem muito o que fazer em roteiro sem matiz nenhum - Daniela Escobar, loira, encarna personagem desglamourizado e surpreende um pouco. Filme policial com ares de superprodução, o material publicitário anuncia que com o filme vamos conhecer a fundação do Comando Vermelho, mas também o homem atrás do bandido. Só que ao final nada fica muito claro em meio à tanta pirotecnia, e só se vê muito bandido e homem nenhum por trás disso tudo. A não ser, claro, como extensão e reflexo das manchetes marrons dos jornais nacionais da vida.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

longas brasileiros em 2010 (191)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

191 - Brasil Ano 2000 (1969), de Walter Lima Jr ****

Na década de 1990, dois filmes emblemáticos do período encerravam suas tramas de forma acachapante e usando canções brasileiras que selavam o mostrado em clima de arrepiar. Terra Estrangeira (1995), de Walter Salles, e Como Nascem os Anjos (1996), de Murilo Salles, e as músicas respectivas Vapor Barato, com Gal Costa, e Magrelinha, com Luis Melodia. Vez ou outra cinema e música fazem casamentos perfeitos como esses em seus acordes finais, como também aconteceu na década de 1960. Como se esquecer de Fuga nº2 com Os Mutantes em Os Paqueras (1969), de Reginaldo Faria? E como se esquecer de Objeto Não Identificado com Gal Costa nesse Brasil Ano 2000? Dirigido por Walter Lima Jr, que também assina o argumento e o roteiro, o filme coloca uma família cruzando o asfalto depois de uma grande guerra nuclear, da qual pouco sobrou. No melhor estilo Dois Homens e um Guarda-roupa (1958), curta de Roman Polanski, aqui quem sai carregando um inusitado móvel é a veterana Iracema Alencar, que ruma em direção ao norte arrastando sua cristaleira e é acompanhada pelos filhos Anecy Rocha e Hélio Fernando - irmão de Sonia Braga. Por acaso, eles desembarcam de carona numa cidadezinha chamada Me Esqueci, vão parar em um posto indígena sem índios comandado por Manfredo Colassanti, que por sua vez treme com a anunciada chegada do general Ziembinski para inauguração de uma base de foguete. O medo de Manfredo é exatamente por não haver mais índios no posto, o que poderá significar seu desativamento, daí oferece casa, comida e dinheiro para toda a família fingir que é um clã de índios e se vestirem a carater. Só que a presença do repórter Ênio Gonçalves pode bagunçar um pouco o coreto de Me Esqueci e o plano que envolve seus novos moradores. Alegoria política com direito a números musicais, em trilha sonora de Rogério Duprat e de Gilberto Gil - com músicas de Gil e Capinan e vinhetas de Duprat - Brasil Ano 2000 é filme embebido do espírito Tropicalista da época, e as presenças dos músicos citados não são à toa. Como os atores soltam o gogó em cena, Gal Costa canta no lugar de Anecy e Bruno Ferreira no lugar de Hélio, já Ênio interpreta ele mesmo suas cenas de canto - ainda que tenha sido dublado nas falas por Rubens Corrêa. Como outros filmes alegóricos dessa época do Cinema Novo, emparedado pela Ditadura Militar, Brasil Ano 2000 também, vez ou outra, se fecha em hermetismos que atravancam um pouco a trama, ainda que se mantenha fascinante - e a fuga em objeto voador, como na canção-tema, poderia ser mesmo possibilidade de viagem última e radical para longe da barra pesada instalada. Walter e Anecy, que vinham do bem-sucedido Menino do Engenho (1965), e que chegariam ao esplendor em A Lira do Delirio (1973/78), realizavam com o filme mais um belo trabalho de um diretor e uma atriz nas telas e casados na vida real. Na ficha técnica, a presença curiosa de Julio Bressane, em época pré-radicalização entre a turma do Cinema Novo e do Cinema Marginal. Urso de Prata no Festival de Berlim de 1969.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

serie deusas (141)


Irene Papas.





Nu!!!

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

longas brasileiros em 2010 (190)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

190 - Sedução (1974), de Fauzi Mansur ****

Fauzi Mansur precisa ser mais comentado, pois é sem dúvida um de nossos mais talentosos cineastas, além de importante produtor de filmes para nomes como Ary Fernandes, Ody Fraga e Luiz Castellini. Dono de filmografia notável - que abriga o sensacional A Noite do Desejo (1973) - seus filmes têm complexidade, mas não abrem mão do diálogo com o público. Nesse Sedução, produção esmerada ambientada nos anos 1930 - fotografia majestosa de Claudio Portiolli - ele trouxe uma família italiana para o Brasil e a máfia junto com ela. O GRANDE Fregolente é o chefão Belacosa, pai de Sandra Bréa, a eterna viúva cujos maridos são assassinados, pois não conseguem engravidar a bela e dar o tão sonhado herdeiro para o mafioso. Depois de exames aqui e acolá, descobrem que Bréa tem o Fator K, substância no sangue que só permite procriação se o varão tiver a mesma constituição sanguínea. Belacosa intitui então o exame de sangue de cabresto à toda a cidade, para desespero de Ney Latorraca, eternamente de olho na butique da viúva e no reinado do chefão, mas que não tem o K nas veias. É aí que entra em cena David Cardoso, um relojoeiro esperto, mas que não saberá medir as consequências perigosas de seus atos. Sedução é comédia com timming perfeito, o que comprova que Mansur tem o mesmo domínio no drama quanto na comédia, ainda mais levando-se em conta que é um filme de época, empreitada nada fácil para muito marmanjo que se aventura por essa seara. Mas poderia dar com os burros n`água se não se cercasse de um elenco perfeito. Fregolente está maravilhoso como o chefão com um pé na Itália e outro na Boca do Lixo, e tem cena divertida com Jussara Freire, bela aos 23 aninhos como pretende à Maria Chuteira em cima do velho capo, quando cansado de esperar a filha engravidar atende os conselhos de seu bando e resolve ele mesmo providenciar o rebento. Ney Latorraca, David Cardoso - em auge de beleza- e Dionisio Azevedo são destaques em elenco admirável - Dionísio em estado de graça. E por fim tem Sandra Bréa exuberante transitando muito bem entre a comédia, a picardia e os arroubos românticos de sua quase viúva negra - a AIDS é mesmo um inferno para qualquer um, mas vendo La Bréa em cena é impossível não lamentar que essa maldita peste tenha ceifado um dos maiores sexy simbols que esse país já revelou. Sedução recebeu muitos prêmios - Melhor Filme, Diretor, Ator (Ney), Atriz (Bréa) no Festival de Guarujá; Coruja de Ouro de Ator Coadjuvante (Ney); APCA de Fotografia para Claudio Portioli; Prêmio Governador do Estado de São Paulo de Ator Coadjuvante (Dionísio).

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

serie grandes damas da tv (72)



Denise Del Vecchio.






Salve Salve!

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

longas brasileiros em 2010 (189)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

189 - Incuráveis (2005), de Gustavo Acioli **1/2

Vez em quando o cinema brasileiro - e não só ele - trancafia um casal em um apartamento, ou em uma casa, ou mesmo em um quarto de hotel ou motel, e conta sua história a partir daí. Algumas vezes os amantes até botam o pé do lado de fora ou até pode aparecer um ou outro personagem, mas ainda assim o foco estará sempre neles. Arnaldo Jabor se deu muito bem em duas ocasiões - Eu Te Amo (1981) e Eu Sei Que Vou Te Amar (1986); Beto Brant foi bem em Cão Sem Dono (2006) e assim assim em O Amor Segundo B. Schianberg (2009); José Eduardo Belmonte foi maravilhosamente bem em Meu Mundo em Perigo (2007); e Gustavo Nieto Roa em Entre Lençóis (2008)... Bom, Entre Lençóis é quase um abacaxi. Não é nem preciso dizer que nesse quase filão além de uma boa direção é necessário ótimos atores, né? E nesse quesito Incuráveis bate um bolão, pois Fernando Eiras e Dira Paes quase dispensam comentários. Na trama, ela é uma prostituta de cem real que ganha quinhentão para atender a proposta dele. Qual? a de ouvi-lo durante toda a noite, que logo depois ela e nós saberemos que pretende ser a última, pois o dito está determinado a estourar os miolos. Os dois vão então para um quarto de hotel barato e em meio à falas e transas mostram e escondem um tanto deles para eles mesmos e para o outro. Ainda que o tema possa sugerir transas com paus e xotas à mostra, o que se vê é muito pouco disso - Eiras chega a esconder o documento quando se levanta nu da cama e de resto quase fica sempre de cueca branca. Já Dira se mostra mais generosamente. Vemos que é uma opção da direção e da fotografia, mas não deixa de tirar um tanto de verdade desse encontro e se revestir um tanto de pudor, ainda que também percebamos não parecer ser a intenção. Já no embate verbal, o conteúdo oscila entre ditos interessantes e outros nem tanto assim, ainda que fiquemos atentos no que aquilo tudo vai dar. Mas é aí que entram algumas artimanhas do roteiro - de Acioli e Marcelo Pedreira e que também está na peça A Dama da Lapa do último e na qual o filme foi baseado - o que dá quase nocaute no construído. Fernando Eiras e Dira Paes estão ótimos em cena - ele, Melhor Ator no Festival de Brasília 2005 - e em vários momentos perguntam um para o outro "O que a gente faz com tudo isso?". Depois, veremos que também iremos compartilhar com esse estado de coisas, ainda que de forma diversa, pois a questão vai se instalar também em nós, só que diante do próprio filme.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

terça-feira, 17 de agosto de 2010

longas brasileiros em 2010 (188)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

188 - O Rei da Boca (1982), de Clery Cunha *****

Que cosmética da fome que nada! No cinema de Clery Cunha os bandidos suam, as putas suam e a polícia também sua. E não adianta estar de um ou do outro lado da lei, pois como já dizia o bordão da outra, não é brinquedo não. Como no Paraíba de Jece Valadão e Victor Lima - Paraíba, Vida e Morte de Um Bandido (1966) - aqui também acompanhamos um longo flashback a partir do momento crucial em que a polícia trancafia o bandidão do pedaço. Ele é Roberto Bonfim, que vai para o caburão enquanto Wilza Carla vibra com sua decaída. Daí, acompanhamos sua escalada desde o início como peão de fazenda, garimpeiro, e, por fim, Rei da Boca. Depois de achar e surrupiar pedra no garimpo que vai dar jeito na sua vida, ele é torturado barbaramente - e Clery mostra tudo, inclusive o pau encolhido de Bonfim de tanto levar choque e porrada. Depois de dar pernada a três por quatro vai parar em Sampa, mete-se em briga, vai para a cadeia, vai mais uma vez, e lá faz curso completo de malandragem. Quando sai, embarca no mundo do tráfico, na primeira vez com a maconha e na segunda com a cocaína, e se intitula rei, ainda que duvide quando Wilza, velha e calejada cafetina, avisa que assistirá sua derrota. Depois de dirigir o grande sucesso de público Joelma, 23. andar (1980), filme catástrofe baseado em tragédia real e de acento espírita, Cunha voltou ao mundo policial onde já realizara Os Desclassificados (1972), e O Outro Lado do Crime (1979), e fez seu melhor filme. Aqui, conta com Roberto Bonfim, antes da fase atual em que anda fazendo caras e bocas e quando era um dos mais interessantes atores do cinema nacional, como o protagonista Pedrão, em elenco sensacional. Pois O Rei da Boca junta, de uma vez só, três deusas em ótimas atuações, Zilda Mayo, Claudette Joubert e Zaira Bueno, cada uma dando veracidade às putas do baixo meretrício como são na real e como são também no cinema sem truques de Cunha. E tem ainda a bela Tania Gomide, diretamente da grife Aluga-se Moças de Deni Cavalcanti, como refém literalmente chave de cadeia. É incrível como Clery Cunha tem pleno domínio, tanto na direção de cena quanto na direção de atoes. Em O Rei da Boca há pulsão de vida e morte incrustada em cada fotograma, mas não aquela para a qual o paraíso está ali há dois passos. Aqui, o buraco é quente e bem mais embaixo, e Clery sabe bem disso. Não à tôa já começa os créditos agradecendo aos rufiões, trombadinhas, trombadões, prostitutas e afins, toda uma fauna da Boca do Lixo onde filmou e que, com certeza, contribuiu e muito para a verdade que exala da tela.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

longas brasileiros em 2010 (187)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

187 - Person (2006), de Marina Person ***

Dirigido pela filha Marina, Person é um documentário afetivo sobre um dos nossos mais talentosos cineastas. Por ser afetivo, ele se vale de muitas imagens caseiras, sejam de fotos ou de filmagens, em que, quase sempre, ele está brincando com as filhas, Marina e Domingas. E talvez esteja aí um dos atrativos maiores do filme, que é ver o diretor de filmes rigorosos como São Paulo S/A (1965), e O Caso dos Irmãos Naves(1967), em momentos de pura descontração. Como em outros documentários, há os inevitáveis depoimentos, com a diferença de que aqui os depoentes não são arroz de festa e são de alto calibre: Antunes Filho, Millôr Fernandes, Glauco Mirko Laurelli, Jean-Claude Bernardet, Carlos Reichenbach, Jorge BenJor, Raul Cortez, Eva Wilma, Walmor Chagas - só a possibilidade de ouvir e ver o quase recluso Antunes Filho já faz toda a diferença. De material público de arquivo, há ótima entrevista para o programa Luz, Câmera, Ação, em que Luis Sérgio Person é sabatinado pela atriz Joana Fomm e fala de sua carreira - é divertida sua auto-crítica como ator e ouvi-lo falando sobre a trajetória na publicidade, ao mesmo tempo que é estranho ouvi-lo renegar o bacana Panca de Valente (1968). Um dos maiores destaques são as imagens do projeto não concluído sobre a Jovem Guarda - SSS Contra a Jovem Guarda - em que podemos ver, inclusive, Elis Regina visitando o programa dos antigos rivais. Marina Person fez carreira importante na MTV e se tornou cineasta e atriz - tem boa participação no belo Bens Confiscados (2004), de Carlos Reichenbach. Em Person ela fez um filme com uma pegada quase doméstica, não na estética, mas no conteúdo, já que ao mesmo tempo que fala do cineasta, fala também do pai e de sua família - ela, a mãe Regina Jehá e a irmã Domingas Person vêem fotos, conversam entre si, caminham juntas. O encanto pode até ser procurado nesse enfoque, a falta que ele faz - e faz muita! - não só para o cinema nacional, como também para aquela família. Mas é o próprio Luis Sérgio Person em cena que nos rouba sempre o olhar.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

serie deusas (140)


Ellen Burstyn.





Nu!!!