quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (285)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

285 - Elas São do Baralho (1977), de Sílvio de Abreu *****

Antes de virar novelista consagrado, Silvio de Abreu bateu ponto na Boca do Lixo como cineasta, roteirista e até como ator - em A SuperFêmea (1973), de Aníbal Massaini Neto. O sucesso maior como diretor foi com o drama erótico Mulher Objeto (1981), mas Abreu realizou também comédias, gênero que exploraria depois com enorme talento na TV. A melhor é esse Elas São do Baralho, que roterizou com Rubens Ewald Filho - com quem escreveria a novela Éramos Seis (1977) para a Tupi - em encomenda do produtor Aníbal Massaini Neto. No enredo, Claudio Correira e Castro, chefe de uma corretora em Belo Horizonte, é transferido para São Paulo, para onde vai com a esposa Sonia Mamede. Na chegada a Sampa, eles passam por assaltos de toda ordem, seja de um bando de ladrões - Adoniran Barbosa bradando "mãos ao ar" é hilariante - seja de uma turma de pivetes, e ainda com passagem pelo xilindró. Mas o que o casal nem imagina é a confusão que vai se meter quando os funcionários do escritório - Antonio Fagundes, Nuno Leal Maia, Hugo Bidet e Carlos Koppa - marcam uma reunião de buraco, o patrão leva a patroa, e eles ficam desesperados. Isso porque, na verdade, o encontro era uma armadilha para dobrarem o chefe mineiro careta, que ficaria no mesmo local com um quinteto de prostitutas do balacobaco - ou melhor dizendo, do baralho: Marivalda, Arlete Moreira, Esmeralda Barros, Francys Meyre e Valéria D`Ellia. Elas São do Baralho foi originalmente pensado como um dos dois episódios de um filme, mas Massaini gostou do resultado e resolver esticar. Abreu e Ewald Filho se recusaram a escrever o acréscimo, e Adriano Stuart e Roberto Silveira criaram um prólogo e um epílogo para que a produção se transformasse em um longa. Esse ínicio, inclusive, foi rodado em Belo Horizonte, e quem é das bandas de cá pode matar saudades do Cine Brasil - que foi um dos maiores cinemas populares do país e será reaberto depois de décadas como um centro cultural com direito a sala de cinema; a Igreja São José - ainda sem cerca; e o Café Nice - que resiste até os dias de hoje. "Essa é a gostosa historinha de um homem comum, é o momento do encontro de alguém com a sensação... com o prazer... e porque não dizer, com a sacanagem!" É assim que a trama é deliciosamente apresentada, em narração sacana, mas como bem diz Abreu em sua biografia na Coleção Aplauso - escrita por Vilmar Ledesma - o nu no filme, ao contrário de muitas produções da época, não é erótico, é engraçado. Realmente, Elas São do Baralho é engraçadíssimo, com toda a sequência do falso jogo do buraco elevando o filme em muitos decibéis. Sonia Mamede passa da recatada senhora mineira para a leoa que está fim de papar Fagundes com toda o timing, a veia cômica e o talento que sempre teve. Já as meninas estão ótimas, sobretudo os nomes de guerra com os quais foram batizadas - Nádia Marcha-Ré, Wanda Cacetada, Julieta Boca de Caçapa, Teresa Torniquete e Tânia Frango Assado. Arlete Moreira está linda; Marivalda fazendo uma deslumbrante mulher devoradora de homem - e meio mulher-bicha - como sempre soube fazer tão bem; e Esmeralda Barros divertida dando pernada a três por quatro com a cara mais séria do mundo. Todo o elenco é ótimo - tem também Yolanda Cardoso fazendo uma franchona dona de uma casa de massagem daquelas - e Hugo Bidet em papel sob medida - ele recebeu o APCA póstumo de Melhor Ator, já que se suicidou pouco tempo depois.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

longas brasileiros em 2010 (284)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

284 - Tudo Bem (1978), de Arnaldo Jabor *****

Cotação cinco estrelas é muito pouco para esse magistral filme de Arnaldo Jabor. Depois de Toda Nudez Será Castigada (1972), em que parecia que o cineasta chegara ao seu máximo, ele realiza alguns anos depois esse desconcertante Tudo Bem - com O Casamento (1975) entre eles. Aqui, ele promove um encontro de classes em um apartamento em Copacabana e faz uma radiografia do Brasil. Paulo Gracindo convive dia-a-dia com os fantasmas de seus amigos enquanto a esposa Fernanda Montenegro se morde de ciúmes de uma hipotética amante do marido - a tal Waldete. Ainda vivem no ap o casal de filhos Regina Casé e Luiz Fernando Guimarães - em época de Asdrúbal Trouxe o Trombone - mais as empregadas Maria Sílvia e Zezé Motta. Fernanda sonha há 26 anos com a reforma da casa e, finalmente, vê a empreitada se instalar na sala da casa, com uma turma de operários - Stênio Garcia, Anselmo Vasconcelos e José Dumont são alguns deles. Dumont, inclusive, leva sua família despejada, que faz acampamento com direito a fogãozinho de tijolo e tudo. Tudo Bem parece mais uma ópera, em que os personagens vão em tom crescente, seja no quarto, na sala ou na cozinha. Nessa última, dois modelos encarnados por Maria Silvia e Zezé Motta - a primeira uma religiosa reprimida e a segunda uma prostituta no turno da noite - se atraem em combustão deflagadora de destinos. No quarto, Fernanda e Gracindo circulam em embates mediados por alusões a remédios e piscininhas de motel, ao mesmo tempo em que toda uma vida de casados pode ser expiada pelo ralo. E na sala, os operários amarram a cara com a batata que cai no chão da marmita e fazem piadinhas autofágicas de suas misérias - "vida de pobre é boa", Fernanda saúda mais de uma vez para todos eles. E há ainda os fantasmas Luis Linhares, Fernando Torres e Jorge Loredo, que evocam Castro Alves, política, massas de macarrão e algumas tantas obscenidades. Com roteiro de Jabor e de Leopoldo Serran - mais a fotografia de Dib Lutfi - Tudo Bem é momento alto na história do cinema brasileiro, em que estão todos os desvarios de seu momento histórico - ditadura militar, fervor religioso, cinismo da classe média e cheiro de batata frita e sardinha. Prêmios de Melhor Ator Coadjuvante para Paulo César Peréio - que orquestra o coro Tudo Bem, enquanto Maria Silva entoa ladainha mortuária - e Melhor Fotografia para Dib Lufti no Festival de Brasília.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

serie deusas (162)


Ginger Rogers.






Nu!

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (283)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

283 - Meu Mundo em Perigo (2007), de José Eduardo Belmonte *****

O cinema de Belmonte é urgente. Sua câmera nervosa e inquieta cola nos personagens e não os deixa um minuto sequer. E aí pode ser tanto por um carinho absoluto por eles, como também como guardião espiador de suas danações. Até agora já fez quatro longas, e os melhores são exatamente o primeiro, Subterrâneos (2004), e esse Meu Mundo em Perigo - o segundo é A Concepção (2005) e o quarto Se Nada Mais Der Certo (2008). Aqui, Eucir de Souza - ator mineiro radicado em São Paulo - e Rosane Mulholland vivem encontro dolorido, mas com rajadas e promessas de elevação. Ele perdeu a guarda do filho e matou acidentamente um homem; ela foge não se sabe de quê e pode não ser nada do que aparenta. Os dois se encontram no Hotel Paramount porque ele achou a carteira dela na rua. E enquanto ela grita dentro do armário e ele chora na cama, frases escritas em papel funcionam como porta de entrada para que ambos se conheçam e mirem o perigo de seus mundos. Há também no elenco Justine Otondo, a ex-mulher de Eucir, que depois de tempo de desestabilização emocional volta para lutar na justiça pelo rebento; e Fernanda D´Umbra, advogada dele e um tanto passional, em estilo bem diverso do que se vê comumente em homens e mulheres de direito. Por fora está a família disfuncional formada por Milhem Cortaz e um pai que o denigre o tempo inteiro e assedia sexualmente sua esposa sem que ele faça nada. Com a morte dele, Milhem passa a caçar Eucir como um anjo vingador de um pai idealizado, ao mesmo tempo em que parece admirar e querer ser aquele que deixou o patriarca morto e estirado na calçada, já que em vida jamais conseguiu revidá-lo - a sequência em que coloca a foto de Eucir ao lado do seu rosto no espelho é reveladora dessa ambiguidade. Tudo ao som de uma trilha sonora estonteante, com uma impactante It´s a Long Way, de/com Caetano Veloso, a nos atordoar o peito - e mais os preciosos roteiro de Mario Bortolotto, fotografia de André Lavenere, e montagem de Frederico Ribeincher. Rosanne Mulholland é impressionante, pois basta aparecer em cena para qualquer câmera - e não só a de epiderme de Belmonte - elegê-la para seus e nossos olhos. E aqui encontra um parceiro à altura, ainda que o registro em que circula Eucir de Souza seja outro e a sedução nossa se dê pela sua entrega absoluta e sem rede de proteção ao seu despedaçado Elias. Cada vez que ele chora - e o choro é abundante e das entranhas - a gente chora junto, e esse choro, o nosso, pode não cessar ainda muito tempo depois da luz apagar e irmos para casa ou para qualquer lugar outro. É arrebatador, e não à toa recebeu o prêmio de Melhor Ator no Festival de Brasília. Existem vários tipos de filmes ótimos: aqueles que vão para o panteão das grandes realizações; aqueles que viram referência; aqueles que fazem história. Meu Mundo em Perigo está em outra chave: é daqueles eternamente do coração.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (282)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

282 - Tropa de Elite 2 - O Inimigo Agora é Outro (2010), de José Padilha ***1/2

O primeiro 1/3 desse Tropa de Elite 2 é muito fraco, daí a gente pensa logo: mas é esse filme que se tornou a maior bilheteria da história do cinema brasileiro? Ainda bem que nos outros dois terços o filme vai num crescendo, mesmo que não se equipare ao anterior. Se no primeiro Tropa os adversários eram os bandidos, a banda podre da polícia e os usuários da classe média, agora a hora e vez são dos políticos em campanha eleitoral e da milícia - por isso o subtítulo. Já o BOPE não, continua preservado, pelo menos na mente do agora coronel Nascimento de Wagner Moura, ainda que com menos espaço na trama. Moura continua lá narrando os acontecimentos, tem fios grisalhos na cabeleira, separou-se da esposa Maria Ribeiro, que por sua vez se casou novamente com o representante dos Direitos Humanos, Irandhir Santos. E por isso haverá um confronto entre os dois, tanto na esfera pública quanto na privada. Há ainda espaço na trama para o Mathias de André Ramiro; o filho de Nascimento, Pedro Van Held; a jornalista Tainá Muller; o policial corrupto Milhem Cortaz; os políticos de André Mattos e Bruno D´Elia; e o chefão da milícia Sandro Rocha. Tropa de Elite 2 tem toda a cara de uma superprodução - a ficha técnica não deixa mentir esse aparato - e consegue diálogo mesmo com o público, não á toa a bilheteria estrondosa em quase quatro meses de exibição. José Padilha procura imprimir na tela - via roteiro seu e de Bráulio Mantovani - todo um estado de indignação pela nefasta associação entre Estado e violência urbana via sistema de corrupção que assola boa parcela de nossos políticos. Durante a trama isso funciona mais organicamente, já a sequência no plenário fica um tanto over e didática por demais. O Nascimento de Moura saliva menos de raiva gozoza como era no primeiro Tropa, ainda que no início torça para que o governador permita que as gangues de Bangu se entredevorem. Os fios tensos do primeiro filme custam a aparecer nessa sequência, o que permite um certo distanciamento, que ainda que prejudique a ação do filme, possibilita-nos ver o que há de bom cinema ali e o quanto há de uma certa arrogância como um Tarzan a bater no peito - como no tom espalhafatoso na mídia envolvendo a tal assinatura de Padilha no manifesto da campanha Pró-Dilma. Tropa de Elite é um filme muito bem fotografado por Lula Carvalho e montado por Daniel Rezende. Wagner Moura está bem, mais quem rouba a cena mesmo é Sandro Rocha, como o imoral manda-chuva da milícia.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

serie grandes damas da tv (93)



Célia Helena.






Salve Salve!