sábado, 11 de setembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (210)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

210 - Sonhando com Milhões (1963), de Eurídes Ramos *****

Diálogo entre filmes e público é uma questão que vira e mexe volta à tona na tentativa de um cinema popular feito hoje no país. Só que no Brasil parece que ninguém está muito interessado em conhecer nossa história cinematográfica, pois por que esses cineastas não olham um pouco para trás e aprendem com diretores como Victor Lima, J.B. Tanko e Eurídes Ramos? Eles fizeram um cinema popular que sobreviveu ao tempo e sem estar subjugado à estética reinante da televisão como muitos dos filmes atuais estão - como se copiar as novelas, fenômeno de massa real e importantíssimo, fosse a única alternativa possível, e que muitas vezes resultam em simulacros ruins do que se vê na telinha. Esse Sonhando com Milhões é exemplo perfeito de cinema popular de altíssima cepa. Adaptado da peça Em Moeda Corrente do País, de Abílio Pereira de Almeida, o filme é engraçado, inteligente e perspicaz na radiografia do jeitinho brasileiro tão atacado em discursos, mas praticado no dia-a-dia em todas as esferas sociais. Muito longe de ser encarada apenas como uma espécie de caricatura de si mesma, como ficou para muitos, Dercy Gonçalves sempre foi grande, e aqui eleva o filme às alturas com a verve que empresta para sua Agripina, a empregada espivetada de Oswaldo Loureiro e Odete Lara, casal de funcionários públicos. Lara é ambiciosa e vive tentando Loureiro, fiscal da receita, a fazer trambiques na profissão que lhes garantiria dinheiro por fora, já que está cansada da vida ordinária que levam. Quando um grupo de usineiros flagrado em roubalheira de impostos tenta comprar Loureiro, e usa Dercy como a emissária do golpe, Odete vê aí a grande chance de sair da pobreza, mas para isso tem que convecer a qualquer custo o honesto marido. O Rio de Janeiro como capital federal, antro de maracutaias cotidianas e ninho da serpente do jeitinho brasileiro é focado com maestria na peça de Abílio Pereira de Almeida, e Eurídes Ramos foi preciso e feliz nessa adaptação para o cinema. Um dos grandes trunfos foi ter Dercy Gonçalves no elenco, que emplacou mais uma personagem inesquecível - e ela já brilhava no cinema nacional desde a Cinédia, nos anos 40 - com a sua Agripina. Dentre tantas cenas memoráveis, a folga com os patrões depois que se torna possível salvação da lavoura "me dê um cigarrete? agora me dê o foguéte?"; a dança com Atila Iório "adoro o twist, aquele que a gente requebra o traseiro e faz cara de triste"; e a promessa que faz para São Jorge prometendo dar a ele um cavalo preto "porque o branco o senhor já tem, né?", completa, gaita e hilária. Sonhando com Milhões é diversão de primeira sem substimar a inteligência de seu público.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (209)

Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

209 - Amante "Muito Louca"! (1973), de Denoy de Oliveira *****

Na época em que Fernando Collor assumiu a presidência do Brasil e promoveu política de terra arrasada na cultura - sobretudo no cinema brasileiro - seu secretário de cultura foi o cineasta Ipojuca Pontes, casado então com Tereza Rachel. Presidente e secretário foram espinafrados, e talvez a ojeriza tenha respingado um pouco em Tereza, pois é impressionante o quanto se fala pouco nela. Bom, pelo menos no lado artístico é pura injustiça, pois ela foi e sempre será Grande Atriz. Talento ela tem de sobra e comprova mais uma vez nessa ótima estreia em longas de Denoy de Oliveira, irmão do também cineasta Xavier de Oliveira. Teresa está sensacional como Brigite, a Louca, estrela de teatro de revista de quinta categoria dirigido por Jô Soares, e que fora do palco vive aos tapas e beijos com o amante bancário Claudio Correia e Castro - que para ela será sempre banqueiro. Quando ele resolve viajar para casa de praia em Cabo Frio com a família - a esposa Beatriz Veiga, os filhos Marisa Sommer e Stepan Nercessiam, e a empregada faz-tudo - ela fica fula da vida e resolve ir para lá também, onde vai afrontar, e se envolver, com todo mundo. Amante "Muito Louca"! faz retrato tocante de uma família de classe média, em que a camaradagem entre pais e filhos segura as pontas dos anseios rebeldes de Sommer e a inadequação de Nercessiam. E mesmo quando a casa cai, afetos coletivos e conveniências particulares vão segurar a onda da família, ironicamente comentada pela música que diz que tudo está legal. Amante "Muito Louca"! é, antes de tudo, um filme amoroso, pois ainda que pulse forte nas aprontações e na atuação para cima de Rachel, reserva para todos, e inclusive para ela, momentos de pura ternura. Além de que é facílimo se encantar por todos aqueles personagens, nenhum perfeito, como não é perfeita a vida, mas todos imbuídos de farta dose de humanidade. Tudo isso é fruto do ótimo roteiro de Fernanda Ferraz e Denoy, do pleno domínio da direção, e também da escolha certa do elenco. Stepan Nercessian, sobrinho de Denoy e revelado no cinema por Xavier nos notáveis Marcelo Zona Sul (1970) e André, a Cara e a Coragem (1971), está maravilhoso em cena, e a gente fica pensando porque esse ator é tão pouco requisitado atualmente pelo cinema - pois quando é chamado arrasa, como faz em Chega de Saudade (2007), de Laís Bodanzky. Como Marcelo e André nos filmes de Xavier, o Lui de Pra Quem Fica, Tchau (1971), de Reginaldo Faria, O Bebeto do segmento de Victor di Mello em Como Era Boa Nossa Empregada (1973), e esse Junior de Amante "Muito Louca"!, Stepan Nercessian encarnou uma gama de adolescentes inesquecível do cinema nacional dos anos 1970. Ainda no elenco, Beatriz Veiga e Marisa Sommer também estão bem, mas quem está no mesmo patamar de Teresa e Stepan é Cláudio Correia e Castro, veterano ator que tem aqui uma das suas maiores atuações. Durante todo o tempo em que acompanhamos a história em nenhum momento passa despercebida a direção afetuosa de Denoy, que vinha da produção e das trilhas sonoras nos filmes do irmão e que chega à direção pronto - o que vai comprovar em outros filmes bacanas como J.J.J, O Amigo do Super Herói (1979). Pena que tenha morrido aos 66 anos, em 1999, interrompendo pequena, mas interessante carreira cinematográfica. Amante "Muito Louca!" foi Melhor Filme pela Crítica, Melhor Atriz (Tereza Rachel) e Ator Revelação (Stepan Nercessiam) no Festival de Gramado; Prêmio Governador do Estado de São Paulo de Melhor Direção; Coruja de Ouro de Melhor Atriz (Teresa Rachel); e APCA de Melhor Diretor e de Melhor Cenografia( Fernanda Ferraz).

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (208)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

208 - Terror e Êxtase (1980), de Antonio Calmon *****

Bom, enaltecer o cinema de culhões de Antonio Calmon já virou arroz de festa aqui no Insensatez. E mais uma vez o caso se repete com esse Terror e Êxtase, que de cara tem um dos prólogos mais sensacionais: Gracinda Freire na praia divagando sobre a vida e seu estado de pós-noite de bebedeira de vodka, minutos antes de encontrar seu destino pelas mãos do anjo do inferno Roberto Bonfim. É acachapante, e isso é só mesmo um aperitivo para o que virá a seguir, quando morro e asfalto se esbarram, mas não nessa cartilha de consciência culpada como se vê em muitos filmes de hoje que promovem esse encontro. Denise Dumont, a cocotinha que faz discurso de ode à marginália e que quer que a burguesia seja morta e enterrada, é bom signo para se enteder esse cinema de ontem e de hoje, pois ela verá na pele o discurso infiltrar em porrada na epiderme, ao contrário de muitos cineastas que miram sua lente para o vespeiro, mas se resguardam dos pés à cabeça em seus casulos financiados e em ar-refrigerado. Na trama, Roberto Bonfim vive de assaltos e mortes até que conhece Denise, apaixona-se por ela e resolve dar um tempo da marginália. Daí, junta-se à gangue, faz assalto a banco e depois planeja o grande golpe final para encher o bolso de tutu: sequestrar André di Biase, drogadito amigo da nova paixão e filho do pai milionário José Lewgoy. Em meio a isso tudo, conhecemos personagens completamente "Calmonianos", nessa adaptação do livro homônimo de José Carlos Oliveira: Maria Lucia Dahl, a mãe dondoca que transa com michê fixo nas barbas do marido Nildo Parente; Anselmo Vasconcelos, o alucinado e violentíssimo bandido Minhoquinha; André di Biase, o filhinho de papai que delira em poesia e vômito com agulha fincada na veia. O filme tem sequências absolutamente geniais e desconcertantes, como só Calmon parece saber fazer: o comercial particular de ostras de Maria Lucia Dahl; o acerto de contas entre Bonfim e o crente de praça central que sacou a bíblia na hora de agonia de sua mulher Maria D´Alves; o estupro desvairado promovido por Anselmo Vasconcelos; a dança de Anselmo pós noite de terror e sevicia. Como sempre, o cineasta escalou elenco de seus sonhos e para total deleite nosso: Denise - Prêmio APCA de Melhor Atriz - está perfeita, e linda, como a menina que cruzou a fronteira via alucinação das drogas e que agora bota o pé do outro lado de fato; Maria Lucia mais uma vez como a atriz síntese do diretor, e como em Gente Fina É Outra Coisa (1977) e O Bom Marido (1978), embute sua persoangem de cinismo e deboche em filigramas; Roberto como Milium, o bandidão com dois dentes de ouro, muita violência na cachola e nos músculos e sempre com um lugar especial para a amada da vez; Anselmo Vasconcelos, que faz de seu Minhoquinha o pesadelo em carne viva e indesviável para quem tem o azar de cruzar seu caminho. Ainda a destacar, a fotografia de Edgar Moura e a trilha de Remo Usai. Ao falar desse Terror e Êxtase é preciso voltar à máxima que também já quase virou clichê aqui no Insensatez: como faz falta o cinema desconcertante, obsceno, indecente e fundamental de Antonio Calmon.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (207)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

207 - Um Anjo Mau (1972), de Roberto Santos ****

Quando são citados os grandes filmes do cinema brasileiro, dificilmente não se fala em Vidas Secas (1963), em Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), em São Paulo S/A (1965), em Terra em Transe (1967), em O Bandido da Luz Vermelha (1968), em Macunaína (1969), e em alguns outros. E também dificilmente não se fala em A Hora e Vez de Augusto Matraga. Só que, paradoxalmente, se os cineastas Nelson Pereira dos Santos, Glauber Rocha, Luis Sérgio Person, Rogério Sganzerla e Joaquim Pedro de Andrade são tão incensados quanto seus filmes, o mesmo não se dá com Roberto Santos. Puro reducionismo dos babacas de plantão, pois esse paulista sempre foi tão grande quanto todos os outros. E se não foi respeitado no final, quando morreu de infarto no aeroporto quando vinha do Festival de Gramado em 1987, onde seu Quincas Borba foi achincalhado pela crítica, ainda hoje boa parte dessa mesma crítica continua criminosamente silenciosa diante de sua importância para a história do cinema nacional. Com nítidas preocupações sociais e políticas em seu sentido amplo, o cinema de Roberto Santos é marcado por personagens castigados pela vida e órfãos de uma terra ou de um asfalto inóspitos, e que, de uma forma ou de outra, buscam seu lugar no mundo, ainda que sabedouros de que mesmo com muita luta esse lugar ao sol pode jamais chegar. Esse Um Anjo Mau não é obra-prima como Matraga, mas de novo é rural, de novo é adaptação literária - dessa vez de romance homônimo de Adonias Filho - e de novo toda a elegância sem firulas da direção está lá. A trama conta a história de Açucena, quase uma versão rural para a Terezinha das quadrinhas, já que ela também terá a vida marcada por três homens, mesmo que não haja lugar em seu caminho para pai, irmão ou mesmo príncipe encantado - ainda que o personagem de Di Franco até que se assemelha ao último da ciranda. Vendida na adolescência pela mãe para um vendedor de secos e molhados quando estava mais interessada no circo que divertia os meninos do vilarejo e sem saber que seu destino já estava selado, ela começa aí a iniciação de couro curtido em que se transformará, a fim de encontrar pelo menos um meio de sobreviver. E ainda assim descobrirá que a própria sobrevivência estará por um fio quando assiste a tragédia que assola sua vida e vê o surdo desejo de vingança instalado. Adriana Prieto - deusa que nos deixou cedo demais aos 25 anos em acidente de carro poucos anos depois, em 1975 - dá vida à protagonista como se fosse o papel da sua vida. Por vezes é injustamente acusada de super-representação, quando o que se vê é a atriz se limpando de toda a areia de Ipanema para se encardir do chão bruto do sertão - o Festival de Brasília reconheceu isso e lhe deu o Prêmio de Melhor Atriz. No elenco, estão ótimos também os três homens de sua vida: o comerciante Jonas Melo, o jagunço Francisco di Franco e o lutador de rua Flávio Portho. Barbara Fázio, com seu porte imponente, rancoroso e trágico, é também destaque nesse filme produzido por Walter Hugo Khouri e William Khouri na época em que assumiram a Vera Cruz. Já na fotografia esplendorosa, a genialidade de Hélio Silva.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

serie grandes damas da tv (77)


Djenane Machado.





Salve Salve!

terça-feira, 7 de setembro de 2010

ode aos militares e aos paus famosos


Já contei aqui da minha fase de colaboracionismo infantil, já que quando criança adorava cantarolar a musiquinha da Ultragás - "terça sim, terça não, ultragás ai no seu portão" - e era completamente contra a liquigás, concorrente da marca na época.

Daí fui saber só de marmanjo, notadamente no documentário de Chaim Litewsk, Cidadão Boilensen, que o manda-chuva do grupo era parceiro dos milicos, e, inclusive, segundo o filme e a História, assistia as sessões de torturas.

Pois hoje, lembrei-me de outro fato para engordar essa minha faceta de colaboracionista.

Quando criança, minha mãe - que jamais foi engajada em qualquer corrente política e estava ali só pela festa e para ver seu irmão que lutara da 2ª Grande Guerra desfilar - levava a gente, de Sabará, para assistir, em BH, a Parada de Sete de Setembro.

O que mais gostava de ver era o desfile da banda, as performances das balizas - olha o lado gay precoce! - e os animais selvagens que rolavam pela av. Afonso Pena afora em jaulas.

Mas lembro também que, durante o tempo todo, ficava lá sacudindo minha bandeirinha do Brasil de papel brilhoso colado em pedaço pontudo de madeira. E muito feliz.

Ou seja, enquando se torturava e matava nos porões, estava eu lá sacudindo bandeira para, possivelmente, boa parte deles naquela época.

Vixe!


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Uma das maiores surpresas assistindo ao filme A Serpente, de Alberto Magno, esse abacaxi comentado em postagem aí pra trás, foi ver o pau de Marco Nanini - será que era dublê?

É impressionante como é raro ver paus famosos nos filmes, daí a minha surpresa quando ele abriu a braguilha e tirou o dele pra fora.

Se as mulheres sempre foram desnudas - e não vai aqui nenhum manifesto a la Pedro Cardoso, é bom que se diga - o mesmo não se dá com a genitália masculina.

Com exceção de alguns poucos cineastas como Carlos Reichenbach, que não se intimidava em expor os paus dos atores, e de David Cardoso, que nunca teve problema em mostrar o próprio, quase sempre era um tal de levantar a coxa para esconder o dito ou então se enroscar em lençóis ordinários para camuflar o pingolin, que não tava no gibi.

No cinema de hoje, poucos fazem coro com esses cineastas que não estavam nem aí para isso - como José Eduardo Belmonte e Cláudio Assis.

Pensando rápido, consigo me lembrar lá atrás da nudez frontal de Reginaldo Faria em Lúcio Flávio - O Passageiro da Agonia; e mais recentemente de Alexandre Borges em Um Copo de Cólera, de Aluisio Abranches, e de Caio Blat em Cama de Gato, de Alexandre Stockler.

Fora isso, o que temos é um Bruno Garcia fazendo contorcionismos inacreditáveis em Cleópatra, de Julio Bressane, para não mostrar o documento.

E, pior, Reynaldo Gianecchini, que protagoniza filme inteiro passado em quarto de motel, o quase ordinário Entre Lençois, de Gustavo Nieta Roa, mas jamais mostra o dito.

Vixe!


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Como podem ver, o assunto confessional de hoje é poder, né? - ou o medo de perdê-lo....

São os ares da data cívica repercutindo.

Vixe!

longas brasileiros em 2010 (206)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

206 - Emanuelle Tropical (1977), de J. Marreco ****

Em 1974, o cineasta francês Just Jaeckin estreou com o sucesso de escândalo internacional, Emmanuelle - e depois continuou focando histórias provocativas, como Historia de O (1975) e O Amante de Lady Chaterley (1981). Já Emmanuelle, que fez da bela Sylvia Kristel estrela mundial, seguiu carreira e virou praticamente uma grife, com diretores diversos e ora com a atriz, ora com outras. O filme original foi proibido pela censura em vários países, e no Brasil não foi diferente. E como também em outros lugares do planeta, a personagem inspirou releituras as mais diversas. Por aqui, qual espaço geográfico seria o ideal para essa empreitada? Claro que foi a Boca do Lixo. E coube ao cineasta mineiro radicado em São Paulo J. Marreco - também chegado em histórias polêmicas, pois fez uma das versões do picante romance de Júlio Ribeiro, A Carne (1975) - a temerária tarefa. Só que o que parecia ser picaretagem acabou resultando em filme dos mais interessantes. Sim, pois ainda que o roteiro de Emanuelle Tropical - também de Marreco - vez ou outra nos brinda com diálogos e frases inacreditáveis, há em cada fotograma um encanto desconcertante que faz a gente cafifar com nossos botões "mas por que estou gostando tanto disso?". O filme tem vários pontos positivos, a começar pela protagonista Monique Lafond, que a cada produção da época se mostrava ainda mais bonita e sedutora - pena que foi dublada, já que seu timbre particularíssimo daria um charme todo especial à personagem. Em entrevista ao site Mulheres do Cinema Brasileiro, ao ser requerida para falar sobre o filme, Monique se saiu gaiata: "pra começo de conversa não me achava nada tropical", e ria solto. E não bastasse ela, Marreco ainda reuniu duas das musas mais amadas da Boca, Matilde Mastrangi e Selma Egrei, em casal lésbico - e ainda com direito à Tânia Alves no elenco. Selma Egrei, mais uma vez com sua beleza translúcida, dá dignidade ofendida na medida certa para sua Mary Clair, e faz composição de mestre para sua contida e triste personagem. Na trama, Emanuelle é modelo e atriz que vive casamento liberal com o marido. Os dois podem ter casos extra-conjugais, mas jamais podem se apaixonar e levar os amantes para a casa em que vivem. Ela se envolve com outros homens, mas procura sempre cumprir o trato; já ele cai de amores por outra e essa relação desestrutura o aparente equilíbrio do casal. Destaques ainda para a fotografia, também de Marreco - e as ambiências bregas, como vapor de sauna e luzes coloridas e brilhantes -, e para a bela e atmosférica trilha de Beto Strada - que marca com perfeição a abertura e o final do filme. Aliás, filme quando sabe acabar quase sempre eleva tudo o que foi visto antes às alturas, e aqui se tem um ótimo encerramento para o mostrado. O elenco masculino também dá conta do recado: Luiz Parreiras, Walter Prado, Marcos Wainberg, Sérgio de Oliveira, Benedito Corsi. Lá pelas tantas, em inesperada cena de metalinguagem, Wainberg diz para Lafond: "não dá para bancar o sueco dos trópicos"; "você é imitação de uma invenção européia"; delicioso!

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (205)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

205 - Os Homens que Eu Tive (1973), de Tereza Trautman ***

Alguns filmes jamais podem deixar de serem conferidos sem perder de vista o contexto em que foram realizados. E aqui não vai nenhum demérito - como tolas discussões sobre obras datadas -muito pelo contrário, pois é ao fazer esse recorte histórico que se pode mirar melhor a importância deles. Como esse Os Homens que Eu Tive, que Tereza Trautman ousou realizar em época de ditadura brava, que não só decepava o conteúdo político ideológico contrário ao regime, como também o de costumes que desafiavam os canônes da tradição, família e propriedade. Pois o filme fala de uma mulher casada que troca de roupa, aliás, tira, para mudar de parceiros sexuais num piscar de olhos e ainda com o consentimento ou conhecimento do marido. Imagina! É claro que o filme foi censurado, pois quer prato mais petulante e indigesto? E a importância do filme não para por aí. O Cinema da Retomada tomou como símbolo Carla Camurati com seu Carlota Joaquina - Princesa do Brazil (1995), e a partir daí o número de mulheres cineastas só faz crescer, e não mais restritas aos curtas. Só que a realidade anterior era bem diversa, já que até a década de 1960, apenas seis mulheres dirigiram longas brasileiros - Cleo de Verberena, Carmen Santos, Gilda de Abreu, Carla Civeli, Maria Basaglia e Zélia Costa, mesmo assim Civelli e Basaglia sendo italianas radicadas no país. Só com as conquistas sociais, sexuais e o feminismo dos anos 60 e 70 é que o panorama possibilitou o surgimento de uma segunda fase de pioneiras - anos 70 e 80 -e da qual Tereza Trautman é uma das integrantes - Vanja Orico, Lenita Perroy, Ana Carolina, Tizuka Yamasaki, Suzana Amaral, Lúcia Murat, Tetê Moraes e Adélia Sampaio são algumas mulheres dessa fase pré-Retomada. Os Homens Que Eu Tive conta a história de Darlene Glória, uma mulher que tem um casamento liberal com Gracindo Junior - os dois têm relações extra-conjugais com consentimento mútuo. E é também em comum acordo que eles resolvem trazer para dentro de casa o amante dela, Gabriel Arcanjo, para dividirem o mesmo teto. Tudo segue normal, até Darlene se apaixonar por Arduíno Colasanti, amigo de seu marido, que não aceita o novo homem do pedaço. E além disso, ainda corre por fora mais um outro pretendente, o artista plástico Milton Moraes - como também o flerte lésbico com Ítala Nandi. O filme foi concebido para ser protagonizado por Leila Diniz, mas a atriz morreu tragicamente em acidente aéreo quando voltava da Austrália, onde foi divulgar Mãos Vazias (1971), de Luiz Carlos Lacerda. Daí Trautman fez acertos no roteiro - que ela também assinou, além do argumento, direção e montagem - e chamou Darlene Glória para o papel. Tanto Leila como Darlene foram sexy simbols incontestáveis da época, ainda que de temperamentos diferentes - Leila mais esfuziante, já Darlene mais dramática. Os Homens Que Eu Tive sustenta o interesse quase quatro décadas depois, ainda que há uma certa fragilidade na construção dos dramas da protagonista, e também nos personagens masculinos, todos eles sem muitos matizes. Destaque de ponta a ponta para a belíssima direção de fotografia de Alberto Salvá, também cineasta que sempre mirou sua lente para o universo feminino - sobretudo em Inquietações de Uma Mulher Casada (1978) - e que era casado com a diretora na época. Na trilha sonora, presença do conjunto O Bando, e de dois petardos da época do disco Transa, de Caetano Veloso - uma vinheta de Its a long way; e a pungente e particularíssima versão dele para Mora na Filosofia, clássico de Monsueto e Arnaldo Passos.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

serie deusas (145)


Sylva Koscina.






Nu!!!

domingo, 5 de setembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (204)

Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

204 - Belinda dos Orixás na Praia dos Desejos (1979), de Antônio B. Thomé *

Quando a mãe de santo diz para Nicole - que ainda assinava sem o Puzzi - que ela seria muito magoada, que seu corpo seria só uma carcaça, mas que a justiça seria feita e os culpados punidos, a gente imagina logo: "vixe, vem aí muito sexo e bárbarie". Mas que nada, nesse roteiro que o produtor Cassiano Esteves escreveu e o cineasta Antônio B. Thomé dirigiu, tudo segue em banho maria, e o o sexo fica por conta de peitinhos e bundas de fora sem muita libido e a violência está resumida em algumas picadas de agulha. E daí a falsa expectativa dá lugar à uma constatação: "Mas quanta falta de tesão!". Na trama, Nicole Puzzi vai acampar na praia ao lado de amigas - entre elas, a bela Novani Novakoski, em participação especial e discreta. Lá, encontra a mãe de santo que lhe faz a sinistra profecia, mas que a adota como filha espiritual e promete lhe acompanhar os passos. Na praia, Nicole conhece, na barraca ao lado, a família de um delegado e se envolve com o varão que fica de quatro por ela. Isso sem saber que um trio de bandidos quer se vingar do pai do moço pelo cerco fechado que o tira mantém sobre ele, e acaba sendo vítima involuntária do plano de vingança. Experiente diretor de fotografia, Thomé dá conta da função e também opera a câmera, o que garante algumas cenas interessantes na praia - não só de exploração de beleza natural, mas, vez ou outra, de composições que vão além desse registro imediato. Mas o que salta aos olhos mesmo, e de forma negativa, é a opção primeira por contar uma história, sendo que o que não há é fábula que sustente a empreitada. Como temer aqueles bandidos que mais parecem vendedores de seguros? Como apostar no entrecho amoroso se o galã com a camisa amarrada na cintura exibe a barriga pontuda e a sunga marron cavada? Se nem o entrecho policial e tampouco o amoroso seduzem, o que resta? Pois linguagem é menor investimento, ainda que, vez ou outra, algumas explorações de angulações do cineasta/fotógrado/camera marquem presença. Realizado nos final da década de 1970, Belinda dos Orixás na Praia dos Desejos não abre mão de enfileirar belas moças com a única função de tirar suas roupas, mas há ainda um pudor um tanto inocente e que garante um interesse quase arqueológico e um encanto todo próprio - pudor que será mandado às favas em outras produções que serão realizadas logo a seguir. Mas o que fica mesmo de tudo só Nicole Puzzi, para todo o sempre essencialmente cinematográfica.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

serie grandes damas da tv (76)



Geny Prado.





Salve Salve!