sexta-feira, 13 de agosto de 2010

longas brasileiros em 2010 (186)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

186 - A Dança dos Bonecos (1986), de Helvécio Ratton *****

Bairrismo à parte, é mesmo impossível não constatar Belo Horizonte como referência de segmentos artísticos importantes da cultura nacional contemporânea. Como falar de dança sem falar no Grupo Corpo? Como falar de teatro de rua sem falar no Grupo Galpão? Como falar de música instrumental experimental sem falar no UAKTI? E como falar de teatro de bonecos sem falar no Grupo Giramundo? Pois são os bonecos encantados do mestre Alvaro Apocalypse - fundador do Giramundo - que estão no centro desse adorável A Dança dos Bonecos. Primeiro e disparado melhor longa do mineiro Helvécio Ratton, o filme é fábula infantil, sem medo de cair no chavão, para crianças e adultos. Wilson Grey é Mr. Kapa e Kimura Schettino é seu ajudante Geléia, dois artista mambembes que circulam em furgão onde apresentam números de mágica, além de vender vidrinhos de água como se fosse poderoso Bálsamo de Minerva, santo remédio que dá conta de todos os males. Quando chegam em Beleléu, Geléia pega água encantada por Iara sem imaginar o que virá a partir disso. Quando Cintia Vieira, a garota Ritinha, lava seus bonecos com a água eles ganham vida, são roubados por Kapa e Geléia, e são cobiçados por executivos de uma grande indústria de bonecos. Começa aí uma aventura mágica em que a fantasia vai se impor, desde, claro, para aqueles que nela acreditam. O cinema brasileiro não tem tantos filmes infantis assim, a não ser que sejam das griffes Os Trapalhões e Xuxa. É claro que tem bons e ótimos exemplares realizados em diferentes momentos de nossa histórica fílmica, mas quase sempre de forma pontual. E nesse panteão, A Dança dos Bonecos tem lugar de destaque assegurado. Afinal, a trama é encantadora e Totoca, Tziu e Bubu dançando ao som da inspirada trilha sonora de Nivaldo Ornellas é mesmo momento inesquecível registrado na retina. Em elenco ótimo, com Wilson Grey protagonista absoluto e Kimura Schettino e Cintia Vieira em atuações luminosas, detacam-se também Ezequias Marques como o empresário que odeia crianças nos bastidores mas na câmera arreganha os dentes para falar de seu amor por elas; Claudia Gimenez como a secretária gulosa e com pitada de petulância debochada característica da atriz; e Rui Polanah como o velho mago. Grande momento do cinema mineiro com projeção nacional.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

serie grandes damas da tv (71)


Angela Leal.





Salve Salve!

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

longas brasileiros em 2010 (185)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

185 - Bruma Seca (1961), de Mario Civelli e Mario Brasini ***

O cenário não é a selva africana, daí saem elefantes, leões e hienas, e entram cobra coral, jibóia, tamanduá, arara, papagaio, siriema e escorpião. Toda essa fauna brasileira cruzará o caminho de Luigi Picchi, Maria Dilnah e Mario Brasini, depois que eles têm que fazer pouso forçado e caminhar mata adentro para chegar à cidade. Todo esse quiproquo é porque Brasini e Dilnah chegam a um vilarejo no meio do nada e contratam o piloto Picchi para levá-los até um garimpo. Lá, Brasini se declara herdeiro da mina, mas os garimpeiros, que já se sentiam dono do lugar por promessa do falecido proprietário, o ameaça e dois deles sabotam a aeronave. Na viagem de volta, o trio, sem gasolina e em meio a bruma seca - efeito climático que assola a região na época de calor - tem que descer na marra, ainda que a selva abrigue perigos e um bando de saqueadores assassinos circule pelo local. Bruma Seca é uma produção de Mario Civelli, cineasta e produtor italiano radicado no Brasil depois da Segunda Grande Guerra, e que fez trajetória na Maristela e na Multifimes. Aqui, assina o roteiro e a direção com Mario Brasini nessa aventura mais existencial e em tom baixo, que qualquer aposta em adrenalina e trama de acontecimentos. Interessa muito mais as pequenas transformações que seus personagens vão sofrendo pelo caminho - o solitário que vislumbra a possibilidade de um novo amor; a mulher que descobre o instinto materno e repensa suas escolhas; o homem endurecido em cinismo que toma atitude em outra escala. Luigi Picchi, com sua masculinidade habitual, encarna bem João Querido, uma espécie de líder local respeitado no vilarejo miserável - não há hotel ou pensão, só na casa dele, do prefeito e do coronel tem cama, e no armazém, onde os de fora comem e os de casa bebem, a cerveja é servida quente e pão só no natal. Bruma Seca é último filme da bela Maria Dilnah - atriz de títulos como Absolutamente Certo (1957), de Anselmo Duarte, e Osso, Amor e Papagaios (1957), de Carlos Alberto de Souza Barros e César Mêmolo - que se casou com Mário Civelli e abandonou a carreira. Ainda no elenco, boas participações de Adoniran Barbosa e Ruth de Souza.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

longas brasileiros em 2010 (184)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)


184 - A Próxima Vítima (1983), de João Batista de Andrade *****

O cinema do mineiro João Batista de Andrade é político até a medula, seja quando em documentário ou em ficção. E mesmo no universo ficcional há quase sempre uma forte pegada documental. Como é nesse A Próxima Vítima, em que a morte de prostitutas está inserida em plena campanha eleitoral de 1982. Daí vemos personagens históricos da política em momento pós-anistia, como Brizola, Lula, Ulisses Guimarães e Franco Montoro - é curiosa a profecia do protagonista para Lula no recem-nascido PT. Na trama, Antonio Fagundes é um repórter de TV separado de Ester Góes e de cacho com a também repórter Louise Cardoso, que trabalha na mesma emissora. Como ficou de fora da equipe que cobre as eleições, sobrou para ele matérias do cotidiano e de polícia, principalmente fait-divers, como a matéria veiculada sobre um homem que negocia a venda de seu rim como se especulasse em um tipo de Bolsa proletária. Fagundes é designado por seu editor Goulart de Andrade - ele mesmo! e ótimo - para cobrir uma misteriosa série de assassinatos de prostitutas que assola o tradicional e decadente reduto italiano do Brás. Na apuração ele conhece Mayara Magri, uma prostituta ainda quase garota e se envolve com ela e com outros habitantes de mundo miserável e fétido das zonas do baixo meretrício, como o dentista-cafetão Gianfrancesco Guarnieri e o suspeito Aldo Bueno, enquanto bate de frente com o perigoso delegado Othon Bastos. A Próxima Vítima é João Batista de Andrade em grande forma, com rigor absoluto de cena e de como enquadra seus personagens e uma São Paulo quase sempre noturna e longe do cartão-postal capitalista da Avenida Paulista. Com argumento seu e roteiro de Lauro César Muniz - também teledramaturgo e altamente politizado - Andrade tem em Antonio Fagundes a persona ideal para compor David Duarte, um repórter cético com a política, mas ainda um tanto ingênuo com as possibilidades de redenção. Na outra ponta está o ambíguo Othon Bastos, possivelmente ex-torturador que agora, em tempos recentes de anistia e em processo de redemocratização, faz discursos ponderados na TV, enquanto barbariza e amedronta no calar da noite. Durante toda a trama, ainda que jamais se dê nome aos bois, salta aos sentidos o quanto o processo eleitoral e a série de assassinatos estão intimamente interligados. A democracia chegou, mas o terror apenas se escamoteou, e os mesmos agentes dos porões agora também entram na sala de jantar pelo noticiário dos novos tempos, que, em tese, estaria ali para denunciá-los, quando, na verdade, acabam por continuar a servi-los. Essa será uma das lições mais amargas reservadas para David Duarte. Destaque tambem para Mayara Magri, ótima como a prostituta Luna - menção honrosa no Festival de Gramado 1984, e para Aldo Bueno como Nêgo, Melhor Ator Coadjuvante em Gramado, e APCA de Melhor Ator - sua cena com Fagundes ao som de Brasileirinho ao cavaquinho e o desabafo em tom de fúria e regada a mijo é impactante e desesperadora sempre. A Próxima Vítima é um dos filmes mais memoráveis da década de 1980.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

terça-feira, 10 de agosto de 2010

longas brasileiros em 2010 (183)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

183 - A Culpa (1971), de Domingos Oliveira *****

Escrita por Lauro César Muniz e exibida na Rede Globo entre 1979 e 1980, a novela Os Gigantes não fez muito sucesso, mas era um deleite doído assistir toda noite a sua charmosa e melancólica abertura em close na protagonista Dina Sfat, ao som da bela canção Horizonte Aberto com Sérgio Mendes e Gracinha Leporace. Muito daquela aura enigmática dessa estupenda atriz, ainda que em registro diverso, pode ser visto em maravilhosa cena crepuscular em frente ao espelho desse surpreendente A Culpa - é momento inesquecível. No filme, Dina Sfat e o irmão Paulo José - casados na vida real na época - matam o pai, com a ajuda também de Nelson Xavier, o noivo. Daí herdam a fortuna do construtor e se mudam para o Reduto, casarão de campo onde passaram a infância. Ainda que a polícia tenha, aparentemente, engolido a possibilidade de desaparecimento do empresário, não será muito fácil para eles desviarem de seu incômodo assédio. Principalmente quando uma série de acontecimentos perturbadores e inquietante têm início e Nelson Xavier passa a ser assolado por dores de cabeça intensas. Ainda que em Todas as Mulheres do Mundo (1967) e em Edu, Coração de Ouro (1968) vê-se pitadas de melancolia, eles são, sobretudo, filmes solares. Daí a surpresa com esse A Culpa, todo ele pra dentro, soturno, introspectivo. No prólogo, Domingos Oliveira, que assina o argumento e divide o roteiro com Joaquim de Assis, decanta teoria de Freud, em que na origem seríamos herdeiros de uma consciência criminosa, e portanto culposa, já que o pai primeiro foi assassinado pelo filhos que nos geraram. E arremata, dizendo que mesmo que tenhamos participado ou não daquele crime somos todos culpados em essência, pois a culpa é a expressão do embate entre os instintos do amor e da morte. Altamente sofisticado, todo o filme é construído a partir dessa premissa, com esse sentimento que, em teoria mais simplória mas altamente corrosiva como a culpa católica, também faz seus estragos em todos nós de geração à geração. Dina Sfat, Paulo José e Nelson Xavier estão soberbos - e eles são sempre - mas o que mais salta ao olhos é a fotografia acachapante. Ela é mesmo quase um personagem dentro do filme, já que é a partir da atmosfera criada por ela que nos embebedamos em mel e fel desse breve e intenso retrato trágico da existência. Não à toa Rogério Noel papou todos os prêmios da categoria na época - Festival de Brasília, Governador do Estado de São Paulo, Coruja de Ouro, APCA. Dina Sfat faturou o Air France, e Domingos Oliveira o Coruja de Ouro. Mais um belíssimo filme de um cineasta singular do cinema nacional, A Culpa merece ser mais conhecido.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

serie deusas (139)


Monica Bellucci.





Nu!!!

domingo, 8 de agosto de 2010

longas brasileiros em 2010 (182)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

182 - Álbum de Família (1981), de Braz Chediak **1/2

Na década de 1980, Lucélia Santos reinou nas adaptações de Nelson Rodrigues - Bonitinha, Mas Ordinária (1980), e Álbum de Família (1980) ambos de Braz Chediak; Engraçadinha (1981), de Haroldo Marinho Barbosa; e a minissérie Meu Destino É Pecar (1984), de Euclydes Marinho. Aqui ela é Glória, integrante de uma família disfuncional e toda ela marcada por amores pecaminosos - filho pela mãe, filha pelo pai, mãe pelo filho, pai pela filha, irmão pela irmã, tia pelo cunhado. Rubens Correia é o patriarca poderoso e devasso, que cheio de tesão pela filha a tranca em um colégio de freiras, enquanto papa todas as garotas virgens da região. Dina Sfat é a mãe, desejada pelo filho mais velho e com um amante secreto. Carlos Gregório tem fixação pela mãe, e por isso fica impotente com a esposa. Marcos Alvisi é apaixonado pela irmã e sem conseguir frear o desejo entra para o seminário. Gustavo José é o filho caçula que enloquece e completamente nu se integra à natureza feito animal selvagem. E Wanda Lacerda a tia apaixonada cegamente pelo cunhado e provedora das virgens para seu abate. Quando Lucélia volta para casa expulsa do colégio por ser pega na cama com Alba Valéria, sua chegada vai deflagrar todo um acerto de contas entre a família. Em Álbum de Família, Nelson Rodrigues não deu sequer uma aresta de relações convencionais entre seus personagens. Se a família brasileira, com tudo que ela esconde debaixo do tapete e nos confessionários da igreja, sempre foi seu foco preferencial, aqui ele chutou o balde e colocou em cena todo tipo de perversão. Se em Bonitinha, Mas Ordinária e em Perdoa-me Por Me Traíres (1981), Braz Chediak conseguiu um tom mais natural para aquela fauna particularíssima de Nelson Rodrigues, nesse Álbum de Família há um tom um tanto pomposo e teatral, que não se encontra nos outros dois filmes, e ausência completa do humor desconcertante do escritor. Essa opção estética faz dele o menos bem-sucedido dos três, ainda que seja interessante sempre. Mesmo Lucélia Santos, perfeita como Maria Cecília em Bonitinha, não tem muitas possibilidades de passar suas nuances cheias de petulância para sua Glória. Quem brilha mais é Dina Sfat, que está linda e com o talento irretocável de sempre.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

serie grandes damas da tv (70)


Fernanda Montenegro.





Salve Salve!