sexta-feira, 26 de novembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (266)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

266 - Missionários (2005), de Cleisson Vidal e Andréa Prates **

Para muita gente, bandido bom é bandido morto, e palanques para a pena de morte surgem a cada esquina, mandando para longe qualquer tentativa de reflexão sobre o assunto. Nessa hora, saca-se a lição do Velho Testamento mas incrustada nesses partidários: olho por olho, dente por dente. Ainda mais em momentos como os atuais, em que imagens na TV do confronto entre polícia e traficantes no Rio de Janeiro mais parecem de uma guerra. A prisão é um ato punitivo, e é também, em tese, processo de ressocialização - trancafia-se para que, depois de cumprir a pena, o preso possa ser devolvido a sociedade. Só que não é necessário fazer nenhuma pesquisa para saber que cadeia é sinônimo de inferno e curso intesivo de profissionalização de bandidagem, e que muito preso realmente sai pior do que entrou. Não há aqui nenhuma tentativa de diminuir a dor de quem foi vitimado pela violência, mas é necessário dizer que o tema é mais complexo do que querem os absurdos justiceiros de plantão e que um preso que cumpre pena tem todo o direito de voltar a viver em sociedade com seus direitos adquiridos - foi punido e pagou a punição. O documentário Missionários focaliza três detentos da Frei Caneca, no Rio de Janeiro, que redirecionaram sua vidas montando uma banda de rock. Com 20 anos de pena, todos três foram presos entre os 19 e 20 e poucos anos por latrocínio - roubo seguido de morte -, sendo que dois cumprem pena em regime fechado e um em semi-aberto. Dois deles, o vocalista Pedro e o guitarrista André, se aproximaram pela admiração mútua pela música da extinta banda Legião Urbana. Daí, começam a ensaiar e aprender o ofício na marra, recrutam o terceiro, o baixista Luciano, e mais um baterista, que não tem trajetória focalizada. O que de início poderia ser uma forma de abstração do universo da cadeia acaba tomando grandes proporções, com direito à formação da banda Missionários do Rock, que ganha espaço na mídia, gravação de CD, e por fim esse documentário exibido no Festival É Tudo Verdade e no Festival do Rio. Em um tempo em que nem o jornalismo consegue aplicar a imparcialidade - que sempre foi mito, mas cuja procura vem sendo jogada para as cucuias - o que não há nesse doc é preocupação com esse registro. Os diretores Cleisson Vidal e Andréa Prates são abertamente defensores da causa de seu objeto, e é aí que se revela o calcanhar de aquiles do intento - não por serem defendores, mas a forma como às vezes defendem. A trajetória do trio de presos tem por si só características notáveis, pois é retrato positivo de um estrato normalmente reduzido a nada. Só que é a total parcialidade dos realizadores que prejudica o resultado do filme, pois fica nítida a impressão de que, imbuídos dessa vontade de dar voz ao objeto, eles não conseguem cortar onde necessário e nem evitar registro de momentos emocionais desnecessários - não na realidade, pois legítimos, mas para o filme. Isso acaba por imbuir de tintas melodramáticas alguma sequências de uma situação que já fala por si só. Nesses momentos, dá-se uma manipulação over, como se o entendimento do mostrado pudesse vir só com a comoção, quando na verdade é, principalmente, em falas racionais como as de um deles, André, e nas da mãe de Paulo, que o entendimento desse estado de coisas se realiza mais eficazmente. Há ainda uso de recurso de busca de efeito - também utilizado no belo Contratempo (2008), de Malu Mader e Mini Kerti - sobre o caminho de um deles. Missionários conta história importante, sobretudo pela dignidade readquirida, não pelas mãos do Estado, mas pelos próprios agentes de sua história - ainda que como cinema não alcance grandes voos.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

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