quarta-feira, 1 de setembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (200)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

200 - João - A Faca e o Rio (1972), de George Sluizer *****

Que nada! Esqueçam Zalman King, que veio rodar Orquídea Selvagem (1990) no Brasil e colocou os personagens passeando de táxi da Avenida Atlântica, no Rio de Janeiro, até o Pelourinho, na Bahia. Esqueçam também Fábio Barreto, que trouxe Natasha Henstridge para acariciar o peito enquanto um constrangido Eduardo Moscovis canta Villa-Lobos para a lua. Se é para ficarmos com olhar estrangeiro, seja de fora ou mesmo de dentro do Brasil, fiquemos com esse acachapante João - A Faca e o Rio, do cineasta francês radicado na Holanda George Sluizer - que depois filmaria O Silêncio do Lago (1993) nos EUA. Co-produção Brasil/Holanda, o filme é uma adaptação da novela do escritor e jornalista Odylo Costa Filho, que também assina o roteiro com Sluizer. Poucas vezes se viu um gringo filmar no Brasil, e contando uma história brasileira, com tanto domínio da cultura local. Ok, poderão dizer alguns que está tudo lá na novela e que além do mais o próprio Costa Filho marca presença no roteiro. Mas não se pode esquecer que cinema não é literatura, e que quando não reza a cartilha do varejão comercial, com certeza o olhar do autor fica imprimido. E como esse João está no último caso, é impressionante a atmosfera captada em cada fotograma do muito que somos e da cultura dos vaqueiros que vemos de ponta a ponta nesse magnífico filme. Na trama, Joffre Soares é o vaqueiro João, um homem que é capaz de salvar um garoto e adotá-lo e fazer e empinar pipa com o filho do patrão, mas também de matar à faca 53 onças. Na cultura local do grotão no Maranhão em que vive, o divertimento é pegar boi pelo rabo, dar pinote nele e morder seu rabo. E é numa dessas festas que Joffre bota olhos certeiros em Ana Maria Miranda e resolve se casar, ainda que ela tenha 20 anos e ele já passe dos 60. Mas como depois das bodas não consegue consumar o sexo com a moça, e ciumento até a medula, resolve ir para o Amazonas para enricar a fim de compensar a bela com ouro. Pensa em ficar por lá menos de um ano, mas fica quatro, e quando chega não gosta do que encontra. Basicamente centrado em Joffre e em Ana, o filme agrega no elenco desde poucos atores experientes, como Áurea Campos, até muitos anônimos com os quais o personagem vai encontrando pelo caminho, já que a as locações foram feitas no Maranhão, no Piauí, no Pará e no Amazonas. Tudo isso dá uma cor de verdade tão legítima, que vez ou outra chega-se a pensar se não é o Cinema Novo subindo o nordeste para arribar no norte. Como em Chuvas de Verão (1977), de Carlos Diegues, Joffre Soares tem aqui uma de suas mais impressionantes interpretações. Se no primeiro exala doçura angustiada, aqui encarna a face dura com a garganta esmagada pela flecha preta do ciúme - dentre tantas cenas impressionantes, a que chora em aboio em plena mata amazônica é sinônimo de muitos prêmios. Não à toa, ele foi Coruja de Ouro de Melhor Ator e foi premiado na mesma categoria no Festival de Cinema de Santos - o filme foi também Melhor Roteiro em Santos, e Menção Honrosa pela Academia Cinematográfica de Hollywood em 1973. Como contraponto, tem Ana Maria Miranda linda em seus 20 anos e perfeita como Maria - Miranda foi atriz atuante na década de 1970, mas abandonou a carreira e depois se tornou escritora consagrada. Os dois atores sequestram nosso olhar o tempo todo, e de determinado momento para frente uma revolta surda se instala e nos faz cúmplices de mãos atadas para o universo que se descortina à nossa frente. Trilha sonora de Villa-Lobos. Inesquecível!

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

2 comentários:

  1. Pô Adilson! Lendo esse texto dá uma vontade danada de ver o filme. Você viu no Canal Brasil? Sou fã do Jofre, a atuação dele no O Predileto do Roberto Palma é demais.

    Matheus Trunk
    www.violaosardinhaepao.blogspot.com

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  2. Meu amigo, não foi no Canal Brasil não.
    Foi em VHS gravada do Cine Brasil da TV Cultura, há muitos e muitos anos.
    O Joffre está sensacional e o filme é mesmo arrebatador.
    Abração

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