Filmes brasileiros assistidos ou revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)
124 - Aqueles Dois (1985), de Sergio Amon ****1/2
Dedes tempos imemoriais que os gays brasileiros são chamados de veados, o que por sua vez tem identificação no número 24 do jogo do bicho - que como o samba, o futebol e o carnaval é cartão de visita amado ou não da cultura nacional. Daí a graça involuntária do número dessa postagem. Atualmente, para muitos, a única estética possível para os gays é o de pessoas discretas e masculinizadas ou bombadas. É bom mesmo que as pessoas saibam que um homo não é nem mais nem menos homem que um hetero. Mas é bom que essa gente saiba também que ser mais ou menos homem não tem nada a ver com ser discreto, masculizado, bombado, efeminado, chamativo, bichinha ou boneca. As pessoas devem ser do jeito que elas querem ser. Inclusive para esse gays discretos, masculinizados e bombados que se equecem que só podem circular hoje com uma certa liberdade porque foram esses efeminados, chamativos, bichinhas e bonecas que sempre deram a cara para bater, e muito das conquistas de hoje devem-se a eles. Pode não haver desejo entre as partes, mas há de se ter respeito. Esse belo Aqueles Dois, de Sergio Amon, fala muito sobre isso. Não sobre o embate entre gays, mas sobre o escárnio - eterno? - dos heteros sobre os gays, e do medo que homens e mulheres têm da sexualidade. E fala, sobretudo, das sutilezas que existem em uma relação como a que é mostrada. Raul e Saul começam a trabalhar em uma repartição pública no mesmo dia. Raul é extrovertido, adora boleros espanhóis e de Dalva de Oliveira, confraterniza-se com os colegas, e até engata um pega sem muita vontade com uma funcionária. Já Saul é introvertido, fica na dele, saiu de uma tentativa de suicídio, e gosta mesmo é de assistir filmes velhos na TV. As paradas para o cafezinho de garrafa térmica no serviço vão aproximar os dois, e mais que devia pelo julgamento dos colegas de trabalho. Começam aí os cochichos, as piadinhas e o escárnio da repartição, e a descoberta de identificação e de afetos entre os dois. Produção gaúcha da Z Produtora, que reuniu integrantes de ampla experiência no Super-8 do pedaço, o filme tem na ficha técnica nomes muitos conhecidos desde então: Giba Assis Brasil na co-assistência de direção; Sérgio Daniel Lener na co-produção executiva; Rudi Lagemann na co-produção executiva e na co-direção de produção; e Cesar Charlone na direção de fotografia. Baseado no conto Aqueles Dois - História de aparente mediocridade e repressão, do GRANDE Caio Fernando Abreu, o filme tem roteiro de Pablo Vierci e de Amon. Há, lógico, muitas diferenças entre filme e conto, sobretudo no universo interior dos personagens, mas a base exterior da mediocridade da repartição - o deserto de almas, como Raul e Saul a chamavam - mantém-se. Protagonizado belamente por Pedro Wayne - Saul, dublado por Werner Schunemann, e Beto Ruas - Raul, o filme foi premiado no Rio Cine Festival 1985 e no Festival de Fortaleza no mesmo ano. Aqueles Dois é uma pequena jóia, que sem grande arroubos aposta no tempo da delicadeza para falar de pressões e de pulsões internas e externas, de amor, de vida e de morte.
Cotações:
+ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo
(em 2009 - 315 filmes)
124 - Aqueles Dois (1985), de Sergio Amon ****1/2
Dedes tempos imemoriais que os gays brasileiros são chamados de veados, o que por sua vez tem identificação no número 24 do jogo do bicho - que como o samba, o futebol e o carnaval é cartão de visita amado ou não da cultura nacional. Daí a graça involuntária do número dessa postagem. Atualmente, para muitos, a única estética possível para os gays é o de pessoas discretas e masculinizadas ou bombadas. É bom mesmo que as pessoas saibam que um homo não é nem mais nem menos homem que um hetero. Mas é bom que essa gente saiba também que ser mais ou menos homem não tem nada a ver com ser discreto, masculizado, bombado, efeminado, chamativo, bichinha ou boneca. As pessoas devem ser do jeito que elas querem ser. Inclusive para esse gays discretos, masculinizados e bombados que se equecem que só podem circular hoje com uma certa liberdade porque foram esses efeminados, chamativos, bichinhas e bonecas que sempre deram a cara para bater, e muito das conquistas de hoje devem-se a eles. Pode não haver desejo entre as partes, mas há de se ter respeito. Esse belo Aqueles Dois, de Sergio Amon, fala muito sobre isso. Não sobre o embate entre gays, mas sobre o escárnio - eterno? - dos heteros sobre os gays, e do medo que homens e mulheres têm da sexualidade. E fala, sobretudo, das sutilezas que existem em uma relação como a que é mostrada. Raul e Saul começam a trabalhar em uma repartição pública no mesmo dia. Raul é extrovertido, adora boleros espanhóis e de Dalva de Oliveira, confraterniza-se com os colegas, e até engata um pega sem muita vontade com uma funcionária. Já Saul é introvertido, fica na dele, saiu de uma tentativa de suicídio, e gosta mesmo é de assistir filmes velhos na TV. As paradas para o cafezinho de garrafa térmica no serviço vão aproximar os dois, e mais que devia pelo julgamento dos colegas de trabalho. Começam aí os cochichos, as piadinhas e o escárnio da repartição, e a descoberta de identificação e de afetos entre os dois. Produção gaúcha da Z Produtora, que reuniu integrantes de ampla experiência no Super-8 do pedaço, o filme tem na ficha técnica nomes muitos conhecidos desde então: Giba Assis Brasil na co-assistência de direção; Sérgio Daniel Lener na co-produção executiva; Rudi Lagemann na co-produção executiva e na co-direção de produção; e Cesar Charlone na direção de fotografia. Baseado no conto Aqueles Dois - História de aparente mediocridade e repressão, do GRANDE Caio Fernando Abreu, o filme tem roteiro de Pablo Vierci e de Amon. Há, lógico, muitas diferenças entre filme e conto, sobretudo no universo interior dos personagens, mas a base exterior da mediocridade da repartição - o deserto de almas, como Raul e Saul a chamavam - mantém-se. Protagonizado belamente por Pedro Wayne - Saul, dublado por Werner Schunemann, e Beto Ruas - Raul, o filme foi premiado no Rio Cine Festival 1985 e no Festival de Fortaleza no mesmo ano. Aqueles Dois é uma pequena jóia, que sem grande arroubos aposta no tempo da delicadeza para falar de pressões e de pulsões internas e externas, de amor, de vida e de morte.
Cotações:
+ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo
Este é um excelente filme meu caro Adilson. O cinema gaúcho desse período era extremamente forte. Se não estou enganado esse filme tem menos de 90 minutos.
ResponderExcluirMatheus Trunk
www.violaosardinhaepao.blogspot.com
Mais um belo e corajoso texto, meu amigo. Aliás, seus textos estão deixando de ser (apenas) de cinema, mas se transformando em verdadeiros tratados sociológicos (e sem chatices, o que é ainda mais difícil).
ResponderExcluirGrande abraço.
Caro Matheus,
ResponderExcluirDepois de quase uma semana viajando, estou de volta.
Esse Aqueles Dois é bacana mesmo. Tem pouco mais de uma hora, mas dá banho em muito filme por aí.
Um abraço
Caro Sérgio,
ResponderExcluirQue bom que anda gostando dos textos.
Confesso que tem hora que fico meio achando que ando extrapolando. Mas depois deixo publicado assim mesmo, pois são coisas que realmente sinto necessidade de dizer nesses momentos.
Um abração