sexta-feira, 6 de agosto de 2010

longas brasileiros em 2010 (181)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

181 - Ovelha Negra, Uma Despedida de Solteiro (1974), de Haroldo Marinho Barbosa ****

O carioca Haroldo Marinho Barbosa é bam bam bam e tem carreira pequena como diretor de longas, mas altamente preciosa. Em 1981 adaptou Nelson Rodrigues e deu a Lucélia Santos uma de suas melhores atuações em Engraçadinha. Em 1986 escalou Louise Cardoso e Lucélia novamente para um dos filmes mais bem solucionados do nosso cinema em Baixo Gávea (1986). E antes deles todos, ainda na década de 1970, dirigiu esse elegante Ovelha Negra, Uma Despedida de Solteiro, para o qual assinou também o argumento e o roteiro - a estreia foi com Vida de Artista, em 1972. Antes mesmo dos créditos iniciais, Márcia Rodrigues faz votos de que seu casamento dê certo, mas confessa que tem medo do tanto que Joel Barcellos, o noivo, gosta de beber. É véspera do enlace, e o bom vivant vai para Petrópolis com o amigo Tite de Lemos para a derradeira noite de despedida de solteiro. Já no carro ele começa a entornar todas, e não vai ser diferente no hotel Quitandinha, onde vai chapar o melão tanto no Cassino quanto na boate. No fim da noitada de bebedeira, ele se envolve com a cantora Ana Maria Miranda, o maestro Nelson Xavier e o comparsa Wilson Grey, e esse encontro, mais uma aparente crise de amnésia, botam sua vida de cabeça pra baixo. A trama de Ovelha Negra se passa em 1946, época em que os cassinos que fervilhavam nas cidades brasileiras estava no round final para sua proibição. Esse fato colocaria fim em muitas carreiras, sobretudo de orquestras e crooners que se apresentavam na boates, e deflagrando era de ocaso de Grandes Hotéis que tinham nos jogos de azar atrativo para turistas e fonte gorda de lucro - como Petrópolis, cidade que serve de cenário para o filme. A personagem de Maria Fernanda, que perde somas vultosas no bacará e na roleta, mas sempre esperando a sorte virar, é representativa de fortunas que foram levantadas e dilapidadas nesses templos. O filme é precioso na reconstituição dessa época, em que donzelas abandonavam o pudor depois de cheirar lança perfume, em que o casamento era desejado/temido como camisa-de-força indesviável, e em que despedida de solteiro era privilégio para os homens - para as mulheres, no máximo, uma chá de panela à tarde. O filme contrapõe, de forma interessante, o estado psicológico dos noivos. Enquanto Márcia experimenta o vestido de noiva, toma sorvete com a amiga, e tem no casamento o assunto recorrente, Joel parece mais gado se preparando para ir para o abate. Se para ela o casamento é possibilidade, para ele é como rito de passagem, "agora serei um homem sério", ele gosta de reafirmar - ainda que a tia Maria Fernanda não acredite muito nisso. Sem rompantes e de forma estruturalmente sofisticada, o filme constrói sua atmosfera de um estado de coisas que parece de passado longínquo, como num velho retrato clássico pendurado na parede. E quanto mais a noite avança na trama e a hora das bodas se aproxima, mais a gente vê que não é só um estado civil que se despede, é também toda uma era, ainda que seus protagonistas farão de tudo, mesmo que inconscientemente, para que esse novo dia não amanheça.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

2 comentários: