Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)
274 -Vereda da Salvação (1965), de Anselmo Duarte *****
Toda vez que se fala em história da teledramaturgia, nomes como Janete Clair, Ivani Ribeiro e Cassiano Gabus Mendes são sempre apontados como destaques - e com toda a razão. Mas dentre aqueles que foram muito além do folhetim - raiz primordial do gênero - é impossível não se lembrar de Dias Gomes, Walter George Durst e Jorge Andrade, talvez três dos autores mais representativos de apurado olhar crítico, político e social dentro desse universo. Não à toa, Gomes e Andrade são também dramaturgos de alta estirpe. E foi na dramaturgia de Jorge Andrade que Anselmo Duarte foi beber para fazer esse Vereda da Salvação, filme imediatamente posterior ao sucesso internacional O Pagador de Promessas (1962) - até hoje nossa única Palma de Ouro no Festival de Cannes. Mais de uma vez, Anselmo disse que a realização desse filme foi para provar para a turma do Cinema Novo que sabia fazer um filme complexo e de direção sofisticada, já que os cinemanovistas - provavelmente enciumados - apontavam o dedo em riste para a ingenuidade e o academicismo que viam em O Pagador. Quando a primeira montagem da peça estreou foi sucesso de crítica e não de público, mas o cineasta buscou o mesmo Raul Cortez do elenco dos palcos para o filme - para viver sua mãe, trocou Cleyde Yáconis por Lélia Abramo. Aqui, ele assinou o roteiro e contou com a presença de Andrade na adaptação e nos diálogos. Na trama, camponeses vivem acuados em terras cada vez mais demarcadas, sobrando para eles espaço exíguo para tirar o sustento de suas famílias. José Parisi é o líder, mas acaba perdendo terreno para Raul Cortez, que insurge como líder espiritual radical, que promete para todos um lugar seguro no céu, desde que se livrassem de seus pecados. Instala-se então uma histeria coletiva, com direito à violência para aqueles que não aderirem à nova ordem, além de assassinatos de crianças inocentes tomadas por demônios. Se Anselmo Duarte realmente queria mostrar que entendia do riscado - um exagero, pois já provara isso desde a estreia como diretor em Absolutamente Certo (1957) - ele realmente conseguiu. Vereda da Salvação é filme impactante com direção precisa e sofisticada - planos-sequências de tirar o fôlego, câmera focalizando personagens e cenas de ângulos criativos, e fotografia acachapante. Muitas vezes o mostrado é visto de cima, não só apequenando as misérias daquele povo, mas como também se Deus olhasse para aquilo tudo, não acreditasse no que visse e se retirasse. Daí, sobra ora para nós, ora para os fuzis apontados, testemunhar e aniquilar aqueles brados inúteis. Raul Cortez está soberbo em personagem que escamoteia a sexualidade reprimida - homossexualidade, edipianismo, rancor - e dá vazão a seu desatino em fanatismo religioso mortal, acreditando por fim ser ele o próprio Cristo. O elenco feminino é arrebatador, oferecendo nuances de postura e olhar para o que se desenrola, vivido por Lélia Abramo, Esther Mellinger, Maria Isabel de Lizandra, Aúrea Campos e Margarida Cardoso. O cineasta ainda se vale de figurantes completamente críveis, todos eles camponeses de verdade. Mais uma vez, Anselmo Duarte foi negligenciado em sua época, pois realizou fime arrebatador, mas fracasso de público. Fora do país, recebeu inúmeras críticas positivas e quase venceu o Festival de Berlim - perdeu para Jean-Luc Godard com Alphaville. Durante sua vida toda, ele disse que Vereda da Salvação foi incompreendido, mas que é seu melhor filme, a melhor coisa que fez em toda a sua vida. Assistindo uma, duas, três, ou quantas vezes for, fica realmente difícil não concordar com ele. Prêmios de Melhor Fotografia para Ricardo Aronovich e Menção Honrosa para Ester Mellinger e Raul Cortez na I Semana do Cinema Brasileiro de Brasília; Governador do Estado de São Paulo de Melhor Diretor e Melhor Música para Diogo Pacheco; Prêmio Cidade de São Paulo de Melhor Ator para José Parisi e Melhor Roteiro.
(em 2009 - 315 filmes)
274 -Vereda da Salvação (1965), de Anselmo Duarte *****
Toda vez que se fala em história da teledramaturgia, nomes como Janete Clair, Ivani Ribeiro e Cassiano Gabus Mendes são sempre apontados como destaques - e com toda a razão. Mas dentre aqueles que foram muito além do folhetim - raiz primordial do gênero - é impossível não se lembrar de Dias Gomes, Walter George Durst e Jorge Andrade, talvez três dos autores mais representativos de apurado olhar crítico, político e social dentro desse universo. Não à toa, Gomes e Andrade são também dramaturgos de alta estirpe. E foi na dramaturgia de Jorge Andrade que Anselmo Duarte foi beber para fazer esse Vereda da Salvação, filme imediatamente posterior ao sucesso internacional O Pagador de Promessas (1962) - até hoje nossa única Palma de Ouro no Festival de Cannes. Mais de uma vez, Anselmo disse que a realização desse filme foi para provar para a turma do Cinema Novo que sabia fazer um filme complexo e de direção sofisticada, já que os cinemanovistas - provavelmente enciumados - apontavam o dedo em riste para a ingenuidade e o academicismo que viam em O Pagador. Quando a primeira montagem da peça estreou foi sucesso de crítica e não de público, mas o cineasta buscou o mesmo Raul Cortez do elenco dos palcos para o filme - para viver sua mãe, trocou Cleyde Yáconis por Lélia Abramo. Aqui, ele assinou o roteiro e contou com a presença de Andrade na adaptação e nos diálogos. Na trama, camponeses vivem acuados em terras cada vez mais demarcadas, sobrando para eles espaço exíguo para tirar o sustento de suas famílias. José Parisi é o líder, mas acaba perdendo terreno para Raul Cortez, que insurge como líder espiritual radical, que promete para todos um lugar seguro no céu, desde que se livrassem de seus pecados. Instala-se então uma histeria coletiva, com direito à violência para aqueles que não aderirem à nova ordem, além de assassinatos de crianças inocentes tomadas por demônios. Se Anselmo Duarte realmente queria mostrar que entendia do riscado - um exagero, pois já provara isso desde a estreia como diretor em Absolutamente Certo (1957) - ele realmente conseguiu. Vereda da Salvação é filme impactante com direção precisa e sofisticada - planos-sequências de tirar o fôlego, câmera focalizando personagens e cenas de ângulos criativos, e fotografia acachapante. Muitas vezes o mostrado é visto de cima, não só apequenando as misérias daquele povo, mas como também se Deus olhasse para aquilo tudo, não acreditasse no que visse e se retirasse. Daí, sobra ora para nós, ora para os fuzis apontados, testemunhar e aniquilar aqueles brados inúteis. Raul Cortez está soberbo em personagem que escamoteia a sexualidade reprimida - homossexualidade, edipianismo, rancor - e dá vazão a seu desatino em fanatismo religioso mortal, acreditando por fim ser ele o próprio Cristo. O elenco feminino é arrebatador, oferecendo nuances de postura e olhar para o que se desenrola, vivido por Lélia Abramo, Esther Mellinger, Maria Isabel de Lizandra, Aúrea Campos e Margarida Cardoso. O cineasta ainda se vale de figurantes completamente críveis, todos eles camponeses de verdade. Mais uma vez, Anselmo Duarte foi negligenciado em sua época, pois realizou fime arrebatador, mas fracasso de público. Fora do país, recebeu inúmeras críticas positivas e quase venceu o Festival de Berlim - perdeu para Jean-Luc Godard com Alphaville. Durante sua vida toda, ele disse que Vereda da Salvação foi incompreendido, mas que é seu melhor filme, a melhor coisa que fez em toda a sua vida. Assistindo uma, duas, três, ou quantas vezes for, fica realmente difícil não concordar com ele. Prêmios de Melhor Fotografia para Ricardo Aronovich e Menção Honrosa para Ester Mellinger e Raul Cortez na I Semana do Cinema Brasileiro de Brasília; Governador do Estado de São Paulo de Melhor Diretor e Melhor Música para Diogo Pacheco; Prêmio Cidade de São Paulo de Melhor Ator para José Parisi e Melhor Roteiro.
Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo
Meu caro Adilson: onde você viu esse filme? Estou atrás dele há anos. Lendo a sua crítica, aumenta a vontade de ler.
ResponderExcluirMatheus Trunk
www.violaosardinhaepao.blogspot.com
Meu amigo, foi em fita VHS gravada da TV.
ResponderExcluirImpressionante que esse filme não tenha sido lançado em DVD ainda e que também não passe no Canal Brasil.
Abs