Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)
278 - Relatório de um Homem Casado (1974), de Flávio Tambellini ****
O cinema do paulista Flávio Tambellini é todo calcado na alta literatura - Nelson Rodrigues - O Beijo (1964); Pedro Bloch - Até que o Casamento nos separe (1968); Orígenes Lessa - Um Uísque antes... e um cigarro depois (1970); Rubem Fonseca - Relatório de um Homem Casado (1974) e A Extorsão (1975). Os dois últimos filmes foram com o mestre Rubem Fonseca, que assinou o roteiro junto com o cineasta. Tambellini encontrou na novela O Diário de Carlos, do escritor, a elegância necessária para realizar esse memorável Relatório de um Homem Casado. Homens casados e com estabilidade financeira obcecados por jovens perigosas já renderam inúmeros filmes, seja no cinema brasileiro ou internacional - O Anjo Azul (1929), de Josef von Sternberg, costuma ser a matriz de muitos. Mas o grande diferencial desse Relatório é a forma como a direção conduz a história de uma paixão avassaladora com um distanciamento e um tratamento seco incomuns nesse tipo de abordagem. Nery Victor é um advogado casado que leva a vida sem maiores rompantes, sempre com foco nos negócios do escritório que divide com o sócio Otávio Augusto. A morte do pai, José Lewgoy, que no leito de morte lhe revela que nunca amou a mãe dele e teve duas amantes, parece ecoar mais fundo do que imagina no seu mundo organizado e frio. E o encontro com Françoise Forton, uma jovem cliente apresentada pelo devasso amigo Fábio Sabag, coloca sua vida de pernas para o ar. Nery Victor segura bem o personagem, mas quem rouba a cena mesmo é Françoise Forton, que despontava no cinema estonteante, depois da deliciosa participação em fase adolescente com Stepan Nercessian em Marcelo Zona Sul (1970), de Xavier de Oliveira. Na transição entre a fase lolita e a de mulher plena, Forton magnetiza o olhar da câmera com sua personagem amoral - às vezes parece uma menina mimada, noutras uma vamp destruidora. Seu gozo com as sessões de massagem, de ducha e com o esmalte vermelho a lhe ressaltar as garras, enquanto o amante afunda cada vez mais, é símbolo acertadíssimo sobre o quanto uma paixão pode ser ninho perfeito para uma serpente. Mas se a obsessão dele por ela só faz crescer, a encenação continua a perseguir o tom distanciado e, paradoxalmente, quase asséptico - não há, por exemplo, cenas calientes de sexo e a combustão se faz presente em apenas uma cena ou outra. E é nessa escolha arriscada que o filme cresce e nos seduz, avançando léguas e léguas de muitos outros com o mesmo tema. Destaques ainda no elenco para Fábio Sabag, Janet Chermont, José Lewgoy e Betty Saddy. Relatório de um Homem Casado recebeu o Coruja de Ouro de Melhor Roteiro e o APCA de Melhor Filme e de Melhor Montagem (Leon Cassidy).
(em 2009 - 315 filmes)
278 - Relatório de um Homem Casado (1974), de Flávio Tambellini ****
O cinema do paulista Flávio Tambellini é todo calcado na alta literatura - Nelson Rodrigues - O Beijo (1964); Pedro Bloch - Até que o Casamento nos separe (1968); Orígenes Lessa - Um Uísque antes... e um cigarro depois (1970); Rubem Fonseca - Relatório de um Homem Casado (1974) e A Extorsão (1975). Os dois últimos filmes foram com o mestre Rubem Fonseca, que assinou o roteiro junto com o cineasta. Tambellini encontrou na novela O Diário de Carlos, do escritor, a elegância necessária para realizar esse memorável Relatório de um Homem Casado. Homens casados e com estabilidade financeira obcecados por jovens perigosas já renderam inúmeros filmes, seja no cinema brasileiro ou internacional - O Anjo Azul (1929), de Josef von Sternberg, costuma ser a matriz de muitos. Mas o grande diferencial desse Relatório é a forma como a direção conduz a história de uma paixão avassaladora com um distanciamento e um tratamento seco incomuns nesse tipo de abordagem. Nery Victor é um advogado casado que leva a vida sem maiores rompantes, sempre com foco nos negócios do escritório que divide com o sócio Otávio Augusto. A morte do pai, José Lewgoy, que no leito de morte lhe revela que nunca amou a mãe dele e teve duas amantes, parece ecoar mais fundo do que imagina no seu mundo organizado e frio. E o encontro com Françoise Forton, uma jovem cliente apresentada pelo devasso amigo Fábio Sabag, coloca sua vida de pernas para o ar. Nery Victor segura bem o personagem, mas quem rouba a cena mesmo é Françoise Forton, que despontava no cinema estonteante, depois da deliciosa participação em fase adolescente com Stepan Nercessian em Marcelo Zona Sul (1970), de Xavier de Oliveira. Na transição entre a fase lolita e a de mulher plena, Forton magnetiza o olhar da câmera com sua personagem amoral - às vezes parece uma menina mimada, noutras uma vamp destruidora. Seu gozo com as sessões de massagem, de ducha e com o esmalte vermelho a lhe ressaltar as garras, enquanto o amante afunda cada vez mais, é símbolo acertadíssimo sobre o quanto uma paixão pode ser ninho perfeito para uma serpente. Mas se a obsessão dele por ela só faz crescer, a encenação continua a perseguir o tom distanciado e, paradoxalmente, quase asséptico - não há, por exemplo, cenas calientes de sexo e a combustão se faz presente em apenas uma cena ou outra. E é nessa escolha arriscada que o filme cresce e nos seduz, avançando léguas e léguas de muitos outros com o mesmo tema. Destaques ainda no elenco para Fábio Sabag, Janet Chermont, José Lewgoy e Betty Saddy. Relatório de um Homem Casado recebeu o Coruja de Ouro de Melhor Roteiro e o APCA de Melhor Filme e de Melhor Montagem (Leon Cassidy).
Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo
Excelente filme.Direção, figurino, fotografia e trilha sonora.Não me canço de vê-lo e revê-lo sempre que posso.
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