quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (289)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

289 - Corpo em Delito (1989), de Nuno César Abreu **

Os anos de chumbo da ditadura militar são o cenário desse Corpo em Delito, filme de estreia do paulista Nuno César Abreu em longa-metragem. Mas é bom dizer que o cenário aqui não é apenas como pano de fundo, mas como o próprio objeto da trama. Isso a partir da história de Lima Duarte, um médico legista a serviço do estado opressor. A função de Lima é fazer a autópsia em cadáveres de presos políticos barbaramente torturados e depois forjar laudos de morte natural ou por qualquer doença. Vez ou outra , inclusive, aplica injeção durante os intervalos de sessão de tortura para que a vítima não morra antes de abrir o bico. Em conversas com o militar manda-chuva da bárbarie Fernando Amaral ele até faz discurso contra a violência, mas cumpre seu dever sem pestanejar. Quando se aposenta, resolve cuidar das memórias do pai, um militar recém falecido, e, ao mesmo tempo, relaciona-se de forma diversa com três mulheres: a filha Dedina Bernadelli, militante política de quem se mantinha afastado; a namorada Regina Dourado, fogosa artista de boate; e Dira Paes, a misteriosa e solar vizinha de sua casa de praia. Corpo em Delito fala de um momento histórico terrível do Brasil de uma forma original ao fazer de um personagem que cumpre seu dever de forma criminosa, mas sem embates morais, o protagonista da cena. Mas ainda que o argumento seja bom - de Sérgio Villela, que assina o roteiro junto com Nuno - o filme resulta um tanto atravancado. Há, como em muitas produções sobre o período, uma certa deficiência nos diálogos, que em alguns momentos soam como discurso e tiram a naturalidade do dito - aqui, mais notadamente no personagem do militar. O caso entre Lima e Regina, a amante extrovertida e mística - chega a procurar candomblé para dar jeito na relação - também não funciona muito organicamente; em entrevista ao site Mulheres do Cinema Brasileiro, Regina disse que esse foi um filme difícil de fazer, pois teve que se expor muito. Os momentos com a filha são frágeis dramaturgicamente, já nas sequências em que ele observa o jovem casal de vizinhos, sobretudo Dira Paes - aqui em um de seus primeiros filmes e já arrebatando o olhar da câmera -, a ambiência se instala com mais naturalidade e seduz quem está do lado de cá. Só que isso é muito pouco para o fôlego pretendido da história, ainda que o Festival de Natal não tenha achado assim e contemplado Corpo em Delito com seis prêmios - Melhor Diretor pelo Júri da Crítica; Melhor Filme; Melhor Ator para Lima Duarte; Melhor Roteiro para Sergio Villela e Nuno César Abreu; e Revelação para Dedina Bernardelli.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (288)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

288 - As Armas (1969) , de Astolfo Araújo ***

obs.: não consegui imagem do filme

O paulista Astolfo Araújo é mais um desses cineastas injustamente pouco comentados. Sócio de Rubem Biáfora na Data Cinematográfica, que produziu filmes de ambos, Astolfo foi casado com a atriz Joana Fomm, com quem fez As Gatinhas (1970) e Fora das Grades (1971). Esse As Armas é seu longa de estreia e foi produzido pelos papas da Boca Lixo Alfredo Palácios e Antonio Polo Galante. O argumento é dele e de Biáfora, já o roteiro assina sozinho. Na trama, Mário Benvenutti (foto) integra um grupo revolucionário como chofer do líder Cavagnole Neto, mas sempre descontente com sua função por ser mantido à margem das decisões e também por ser tratado como um simples funcionário, quado na verdade tem papel importante ao trasportar documentos sigilosos e perigosos. O grupo é formado ainda por Francisco Cúrcio, Pedro Stepanenko e Irene Stefãnia - essa última filha do chefe e noiva de Pedro, e por quem Benvenutti cresce o olho. Em angústia com seus mais de 35 anos e ainda sem casa para morar - não acredita nas promessas do BNH - ele está muito mais interessado nos seus desejos burgueses do que em qualquer luta por mudanças políticas no país. Esse desejo individual vai entrar em choque com o desejo coletivo - mesmo que esse também pareça ambíguo -, resultando em reviravoltas no seu destino e no dos integrantes da organização. Como em Fora das Grades, filme posterior, esse As Armas tem também estrutura seca, econômica, e sem delírios psicologizantes. E também como no anterior, a questão política está enraizada nos desatinos de seus personagens. Em alguns momentos, o César de Mário Benvenutti parece um pouco o Sérgio Hingst de O Quarto (1968), de seu parceiro Biáfora, ainda que a apatia de Hingst não encontre eco nas ações de Benevenutti - mas algumas semelhanças, como nos encontros com prostitutas nos dois filmes se fazem notar; lá, Hingst quer beijo na boca, aqui, Benevenutti exige, ainda que sem sucesso. Com bela fotografia p&b de Waldemar Lima, As Armas é produção corajosa, pois foi rodada durante a ditadura militar, valendo a Menção Honrosa para o cineasta no Prêmio Governador do Estado de São Paulo 1969. Como nos filmes de Walter Hugo Khouri, Mário Benvenutti é escalação acertada como protagonista, pois consegue encarnar uma certa virilidade claudicante aliada aos tormentos e angústia da alma - mesmo que esses tormentos e angústias se alojem em questões práticas, como é o caso de seu César aqui, um homem em busca de ascensão burguesa. Cúrcio e Neto, atores frequentes nas produções da Boca, dão veracidade aos seus personagens; já Irene Stefânia mais uma vez demonstra, com seu talento e sua beleza translúcida, porque foi uma das musas mais amadas de nosso cinema.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

serie deusas (163)


Yvonne de Carlo.





Nu!

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (287)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

287 - O Sol do Meio Dia (2009), de Eliane Caffé ***1/2

Como se sabe, com o Cinema da Retomada o número de diretoras de longas aumentou em dezenas. Agora, se há um lugar garantido entre as cinco mais talentosas, esse lugar é de Eliane Caffé. Depois do interessante Kenoma (1998) - sua estreia no formato -, ela realizou o ótimo Narradores de Javé (2002), um dos filmes mais memoráveis da década, mas injustamente subestimado e pouco comentado. Agora, Lili - como é chamada - traz à cena esse O Sol do meio dia - que salvo engano chegou a se chamar Andar às Vozes, o que era coerente com os títulos estranhos que ela escolhe para seus rebentos. No filme, a trama junta dois homens de origens diversas e destinos em comum: Chico Diaz herdou o barco e os negócios escusos de contrabando com a morte do pai e é encoxado por gangue perigosa que está no negócio; já Luiz Carlos Vasconcelos acabou de sair da cadeia, tem pesadelos que o atormetam e procura um lugar para si. Os dois acabam se encontrando quando Vanconcelos pede emprego para Diaz, eles seguem o rio para buscar uma encomenda, e no caminho encontram Cláudia Assunção. Mãe de uma jovem que larga a família para se tornar prostituta, Assunção despertará o interesse de Diaz mas ficará balançada mesmo é por Vasconcelos. O Sol do meio dia tem como foco personagens em abordagem à margem de muitas lentes por aí: são rudes, são pobres, não têm beleza padrão - o Matuim de Chico Diaz até tenta dribrá-la com uma peruca. Aqui não interessa o universo violento em que podem estar metidos ou mesmo as questões adversas oriundas desse estrato. O que interessa no roteiro de Eliane Caffé e Luiz Alberto de Abreu não é nem de onde vieram esses personagens - ainda que são sinalizados e têm importância em suas contruções pscológicas, como o negócio do barco, a cadeia e a relação de Assunção com o pai Ary Fontoura; ou para onde vão. O que há de relevante e em nervo central é o que eles são agora, onde e como estão agora, e o choque de suas emoções e percepções nesse momento. É possível a redenção pelo amor? É possível mascarar por gaiatice ou introspecção a solidão ou a falta de rumo? É possível ter um lugar menos ordinário no mundo? O Sol do meio dia brilha, em morte e em vida, é por aí. No elenco, o talento comprovadíssimo de Luiz Carlos Vansconcelos e Chico Diaz, ambos premiados como Melhor Ator no Festival do Rio - Lili Caffé já havia trabalhado com o irmão do segundo, Enrique Diaz, em Kenoma. Aqui, eles encontram ótima sintonia com a mineira Claudia Asunção, uma belíssima estreia no cinema de uma atriz que promete dar muito o que falar.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

domingo, 26 de dezembro de 2010

longas brasileiros em 2010 (286)


Filmes brasileiros assistidos e revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

286 - Aventuras d´um Destetive Português (1975), de Stefan Wohl +

Nascido na Aústria e radicado no Brasil, Stefan Wohl desempenhou várias funções no cinema brasileiro mas como cineasta dirigiu apenas dois longas e um episódio de um outro - segmento Jovem Retaguarda em Quatro Contra o Mundo (1970). Mas se no primeiro, o delicioso O Donzelo (1971), acertou em quase tudo, nesse Aventuras d´um Detetive Português errou feio a mão. Na trama dessa comédia com pitadas surrealistas, um elevador desaparece de um prédio em Portugal com seus ocupantes dentro, e Raul Solnado, um faxineiro alçado inesperadamente a detetive, corre para lá e para cá para descobrir seu paradeiro. O tal elevador acaba aportando em plena bienal de São Paulo, onde é tomado por obra de arte, enquanto uma família, formada por Jorge Dória, seu cunhado Albino Pinheiro e sua mulher Mara Rúbia, aguarda um cardeal, um dos que ocupavam o dito, para celebrar o casamento de sua filha. Dória e Pinheiro farão de tudo para roubar o elevador da bienal e soltar o cardeal, mas terão que enfrentar o destemido detetive - fora que Pinheiro será tomado por artista plástico de sucesso e o elevador será a obra mais cobiaçada da Bienal, numa crítica irônica ao pode tudo da arte de vanguarda. Aventuras d´um Detetive Português era para ser uma comédia, por isso a presença de Raul Solnado, um dos maiores comediantes de Portugal. Só que não há graça nenhuma nesse esquisito filme que não vai para lugar nenhum - não há comicidade e tampouco o recheio surreal seduz. Os únicos momentos de humor ficam a cargo da convidada do casamento que quer ir embora para casa - como no jantar interminável em O Discreto Charme da Burguesia (1972), de Luis Buñuel, aqui ninguém consegue sair da casa dos pais da noiva, pois Mara Rúbia não deixa; e ainda na presença da musa Betty Saddy, uma dançarina de palco que não consegue parar de dançar enquanto o rádio toca música. Mas isso tudo é muito pouco para uma produção cheia de méritos, como o elenco e a ficha técnica - fotografia de Dib Lutfi, montagem de Nazareth Ohana e presença de Ruy Guerra e Flávio Migliaccio no roteiro - assinado por Wohl e também com colaboração de Joaquim Assis. Bola fora.

Cotações:
+ ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

serie grandes damas da tv (94)


Suzana Faini.





Salve Salve!