sexta-feira, 26 de março de 2010

longas brasileiros e 2010 (68)


Filmes brasileiros assistidos ou revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

068 - Na Mira do Assassino (1968), de Mário Latini ****

Assistir filme policial brasileiro é experiência das mais impactantes, pois se há um gênero em que o cinema nacional mais soube falar do país é com certeza esse - pelo menos do país daqueles que quase nunca passam de estatísticas. E essa plebe rude é, quase sempre, formada por mocinhos nem tão mocinhos e bandidos nem tão bandidos, mas todos em caldeirão de alto teor de miserabilidade. E temos aí algo mais brasileiro impossível, em que a geografia excludente por si só é palco tanto para a antropofagia quanto para a autofagia, pois esses Joãos, Marias e Cabos Josés se transformam matando e comendo uns aos outros, e por fim tirando lasca da própria carne, como crônica de morte anunciada e indesviável. Na Mira do Assassino é filme corajoso e também exemplar de uma época de não mais. Corajoso porque sua estética é suja, como é suja a vida em que bandidos e policiais trocam tiros para serem lidos no outro dia em manchetes. Por isso nada de fotografia azulada de ruas e becos fedidos, uma maldição que assola filmes atuais com esse recorte. Ao contrário, muitas das cenas são à noite e os personagens mergulham em sombras, como sombras são muitos deles em suas vidas ordinárias. E é também de um tempo de não mais porque aquela malandragem há muito passou o bastão, e o Toninho de Agildo Ribeiro e o Marcondes de Wilson Grey são mesmo personagens de canção, daqueles que aposentaram a navalha e chacoalham no trem da central. No filme, Agildo - grande ator - é um bandido sitiado pela polícia no ap de um promotor e sua esposa e que ele faz de reféns. Enquanto vê o cerco se fechar à sua volta, ele conta a história de sua vida, e de como um roubo na caixa de esmola da igreja para compar um carrinho para trabalhar na freira e dois copos de groselha para oferecer à amiga magricela, nada mais é que passaporte previamente carimbado para uma trajetória sem volta. E Toninho é apenas um daqueles meninos que comem tomate debaixo das bancas e que a música de Erlon Chaves pranteia, como se fossem Pixotes de ontem, de hoje e de sempre. E além de Agildo e Grey - que faz um escroque como só ele sabia fazer - ainda tem Glauce Rocha, essa atriz estupenda e que traz em si gerações de dor em apenas um olhar. Sua Magricela, aliás, parece embrião para a impactante Norma Suely de Navalha na Carne (1970), obra-prima de Braz Chediak - e que aqui faz assistência de direção.

Obs.: imagem enviada pela querida Andrea Ormond, do blog Estranho Encontro, que, gentilmente, escaneou de capa de VHS. É muito bom saber quando alguém é um pesquisador de verdade, como é Andrea, pois a linha mestra de todo pesquisador sério é contribuir para o acesso às informações. Obrigado, queridona, minha admiração por você e pelo seu trabalho é sem tamanho.

Cotações:
+ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

4 comentários:

  1. Adilson, a idéia é essa mesma. A pesquisa só vale a pena quando a gente pode compartilhá-la. Seu trabalho tb deixa isso muito claro, vai daí o meu carinho por vc. Beijo grande.

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  2. Andrea, querida.
    Mais uma vez, muito obrigado.
    Bjs

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  3. Pek,

    Que bom que há pesquisadores como você, que nos permite saber fatos interessantes do cinema nacional. Mais um filme que não sabia da existência.

    Bjs.

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  4. Obrigado, Noel.
    Não me canso de dizer que o cinema brasileiro é mesmo inacreditável, com muitos filmes pedindo para serem descobertos.
    Bjs

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