sexta-feira, 2 de abril de 2010

longas brasileiros em 2010 (74)


Filmes brasileiros assistidos ou revistos em 2010 no cinema, no DVD e na televisão.
(em 2009 - 315 filmes)

074 - Borboletas e Devassas (2009), de Valter Noronha ***

Quando Boboletas e Devassas começa, a gente já vai logo ficando cismado, "mais um documentário calcado em depoimentos?". Mas a medida em que vamos ouvindo os testemunhos, compreendemos que é ao não se desviar das palavras e reflexões proferidos, a não ser por algumas inserções de cenas de filmes e que nem sempre são muito bem utilizadas, é que percebemos onde reside a força desse Borboletas e Devassas. E não são muito os que falam: os cineastas Carlos Reichenbach, Alfredo Sterheim e Virgilio Roveda; a atriz Débora Muniz; e os pesquisadores Andrea Ormond, Gio Mendes e Alberto Ismael. O filme é sobre a Boca do Lixo, momento único por suas peculiaridades de produção de cinema em solo paulista e que sacudiu o país. O documentário - grande mérito para essa produção independente dirigida por Valter Noronha - faz um mergulho abrangente, indo desde as primeiras produções, passando pela diversidade de gêneros, e com foco sobretudo nas pornochanchadas e no cinema pornô. Para quem acompanha os ditos de Carlão, Sternheim e Ormond sobre o tema pode perceber a coerência do olhar desses três personagens de ponta no universo do cinema popular - Carlão com seu discurso apaixonado, Alfredo com sua elegância habitual, e Andrea com a lucidez que rege seus escritos no indesviável blog Estranho Encontro. E tem também o tom de desabafo crítico de Roveda. Já Gio Mendes, do blog Mondo Cane, e Beto Ismael, do blog Pornochancheiro, fascinam pelo conhecimento orgânico - ainda que possamos não compartilhar de algumas reflexões, sobretudo de Ismael. Um fato importante é o destaque para a construção do pensamento cinematográfico na internet, não só pelos blogs citados, mas também os de agradecimento ao final, constatação clara de que que é aí onde o cinema popular vem sendo reavaliado como tem que ser. Agora se há um ponto que ilumina mais que tudo, ele está na presença altiva de Débora Muniz. Mulher essencialmente de cinema, com trajetória atrás e à frente das câmeras, Débora há muito é musa de quem conhece a produção Lado B da Boca, já que como atriz sua trajetória no período está mais associada à fase pornô. Ela sempre se destacou por uma entrega aos filmes, que ao assisti-los supunhamos, e que aqui deixa claro, ao fazer eco à distinção de Helena Ramos à Boca do Lixo como Boca dos Sonhos e seus significados afetivos. O testemunho de Débora Muniz quebra a espinha de qualquer julgamento apressado sobre o que se pode achar do que é uma atriz que tenha atuado no cinema pornô. É principalmente por seu depoimento que se amplia o que parece ser objetivo da produção e da direção: o de que a Boca é muito mais que um retrato na parede. E quando inrompem as impactantes e festivas cenas do documentário de Ozualdo Candeias com um verdadeiro quem é quem do pedaço, ao som de bela música Cidade das Noites com a cantora Anabela, a gente percebe o quanto amamos toda aquela gente e tudo o que fizeram pela identidade fílmica de um país. Com seus acertos, erros e imperfeições, a Boca do Lixo é um dos momentos mais fascinantes da história do cinema nacional. Fato que esse Borboletas e Devassas, também com seus acertos, erros e imperfeições, ajuda a desembaçar de névoa reducionista de décadas de preconceito e desinformação.

Cotações:
+ruim
* fraco
** regular
*** bom
**** muito bom
***** ótimo

2 comentários:

  1. Pek,

    Que pérola é esta? Você consegue cada filme fantástico! Adorei a resenha e quero muito ver este documentário.

    Bjs.

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  2. Noel,
    Esse filme é bem interessante.
    Quem me enviou foi o próprio Valter Noronha.
    Não sei se ele vai lançá-lo nos cinemas ou diretamente em DVD.
    Vale apena conhecer.
    Bjs

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